O Brasil, em primeiro lugar

Ainda há muito por fazer para que a indústria brasileira readquirarazoável nível de produção e de fornecimento às Forças Armadas

COSME DEGENAR DRUMOND (*) - Tecnologia & Defesa

A trajetória de dificuldades da indústria de Defesa do Brasil é bem conhecida. Remonta a meados da década de 1980. Vinte anos depois, o governo acordou para o grave problema da perda de boa parte da capacidade produtiva do parque industrial, pela falta de encomendas internas. As principais razões que formaram esse quadro foram os sucessivos cortes impostos pelos ajustes fiscais e os acanhados orçamentos militares. A quase totalidade do material de primeira linha que as Forças Armadas importaram nesse período foi lastreada por financiamentos externos.

A indústria de Defesa ainda não colheu resultados concretos para movimentar suas linhas de produção, já que os orçamentos militares permanecem nos mesmos volumes de antes. Hoje, porém, as perspectivas de melhora são latentes. Não apenas porque muitas necessidades materiais nas Forças Armadas continuam abertas e crescendo mais – algo, portanto, terá de ser feito –, mas porque o governo federal tem demonstrado interesse em recuperar e fortalecer a Defesa Nacional. Agências de incentivo às exportações têm mobilizado recursos no sentido de promover a indústria no mercado internacional, sobretudo em exposições tecnológicas. Além disso, o BNDES tem alavancado projetos e empresas do setor de Defesa, atuando como parceiro até mesmo no controle acionário durante um certo período. Alguns dos investimentos são feitos a fundo perdido.

No início de abril, durante a cerimônia de apresentação oficial dos novos oficiais-generais que promoveu, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou: “Precisamos implementar, e não deixaremos de fazê-lo, um plano sério e objetivo de desenvolvimento de nossa indústria de material de defesa. Sem isso, ficará muito difícil alcançar a modernização que todos desejamos”.

Essa nova realidade resulta de um trabalho conjunto entre as instituições governamentais e as associações representativas da indústria. Em janeiro de 2005, um novo e importante aliado foi apresentado: o Comitê da Cadeia Produtiva da Indústria de Defesa (COMDEFESA), da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Seus objetivos visam conscientizar a sociedade da necessidade de se ter uma base industrial de Defesa produtiva e estruturada, diminuir a dependência externa do País nessa área, reduzir a enorme carga de tributos que incide sobre os materiais estratégicos, incrementar a pesquisa e o desenvolvimento, proporcionar competição mais favorável ao parque nacional, frente à concorrência externa, e recuperar a capacidade de compra das Forças Armadas.

Centrado nessas metas, o maior desafio é tentar mudar o atual sistema de aplicação do orçamento federal. Para o empresariado, o desejável seria que o Orçamento da União tivesse caráter impositivo, e não o autorizativo vigente. Assim, segundo acredita, se poderia prever e conduzir sem interrupção os investimentos de longo prazo. Mas não é só. Reforçando o trabalho das associações, o mais novo Comitê da FIESP vem empreendendo, adicionalmente, uma série de ações estratégicas e reivindicações, entre as quais, obter linhas de financiamento, inclusive para pesquisa e desenvolvimento de protótipos e de pré-série, garantias para cumprimento de contratos de exportação e adoção de salvaguardas para a base industrial. Pleiteando a isenção de impostos para os produtos de defesa, elaborou um projeto de Lei Complementar, que está em análise nos Comandos militares. A prática efetiva de Offsets é outra conquista que está sendo perseguida, de modo a beneficiar diretamente as indústrias.

Desenvolvendo outras atividades suplementares, o COMDEFESA visita regularmente as Forças Armadas, para conhecer melhor o potencial das instituições e seus projetos, programas e plataformas. Em parceria com a Escola Superior de Guerra, proximamente realizará o segundo Curso de Gestão de Recursos de Defesa (CGERD), um MBA reconhecido pelo Ministério da Educação e ministrado para 40 empresários, sob o patrocínio da FIESP. O primeiro curso ocorreu em 2006. “O Comitê da Cadeia da Indústria de Defesa está realizando um trabalho muito pró-ativo, em busca de restabelecer aquilo que talvez possa se considerar como perdido ao longo dos anos”, comenta o presidente da FIESP, o empresário Paulo Skaf. “Quando se fala em indústria de defesa e Forças Armadas, estamos falando de soberania, e soberania é coisa séria para qualquer cidadão”.

O maior anseio da indústria de Defesa é ver suas linhas de produção em pleno movimento. Nesse aspecto, o objetivo prioritário é atender o mercado interno. Arrumada a casa, o passo seguinte é aumentar suas exportações que, no passado, chegou a beirar dois bilhões de dólares num único ano. Hoje, o setor vende lá fora por volta de US$ 300 milhões anuais, considerando-se o sucesso individual de algumas empresas, como a Embraer e a CBC, por exemplo. “Aquilo que faz bem à indústria faz bem ao País, pois se trata de produção, emprego, divisas, tecnologias”, diz o presidente do Comitê da Cadeia Produtiva da Indústria de Defesa, o industrial Jairo Cândido.

A FIESP responde por 53% das indústrias do País, 42% do Produto Interno Bruto (PIB) e por 60% das exportações brasileiras. Além do COMDEFESA, a FIESP mantém outros nove Comitês de Cadeias Produtivas, representando vários segmentos industriais.

(*) Cosme Degenar Drumond é diretor de Redação da revista Tecnologia & Defesa.

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