Para general, vazio de poder ameaça Amazônia

Comandante Militar da Amazônia diz que a ausência do Estado na região norte "ainda vai dar problema".

FÁBIO BRANDT (*)

Um vazio de poder ameaça a Amazônia brasileira, abrindo espaço para o crescimento do narcotráfico e dos desmatamentos. A avaliação do general Raimundo Nonato de Cerqueira Filho, comandante do Comando Militar da Amazônia (CMA), é endossada pelo alto escalão do Exército e fundamenta as ações das Forças Armadas na região: defesa do território e apoio logístico ao governo e à população.

O vazio a que Cerqueira se refere é a não-presença do Estado brasileiro na região norte – a maior em área (45% do Brasil) e a menos povoada (3,35 habitantes por quilômetro quadrado), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“Isso vai dar problema”, afirma o General, argumentando que a região tem valor estratégico por abrigar 15% da água potável e a maior biodiversidade do planeta. “Tem muita gente de olho. Precisamos protegê-la e conservá-la”.

Com quatro estrelas no uniforme, Cerqueira ocupa o posto máximo do exército em tempos de não-guerra. Sob suas ordens, há 19 organizações militares e cerca de 25mil homens (entre oficiais e recrutas do serviço obrigatório).

Exército apóia população

Efetivo insuficiente, ele afirma, para quem precisa defender 42% do território nacional, incluindo 1.200 quilômetros de costa e 11 mil quilômetros de fronteira. “O exército faz o papel de outras instâncias do Estado aqui e, muitas vezes, é o único apoio à população”, acrescenta o General.

A presença de narcotraficantes e das Farc nas fronteiras amazônicas do Brasil fez com que o exército adquirisse competências de polícia, podendo revistar e prender pessoas em flagrante (conforme a Lei Complementar 117, de 2004).

Muitos outros “vazios” fazem as atividades do exército na região se desdobrarem, para áreas como transporte e saúde. Exemplo disto é o Hospital Militar do município de São Gabriel da Cachoeira (852 quilômetros de Manaus). “Quem colocou para funcionar foi o exército”, diz o diretor do hospital, Major Couto.

Ele conta que o governo federal inaugurou a obra em 1990, mas o atendimento à população começou apenas em 1995, após o exército enviar médicos-militares para trabalhar nele. “Também fizemos parceria com o Governo do Amazonas e a prefeitura da cidade para as despesas”, diz.

O entorno do hospital denuncia a carência de São Gabriel por serviços básicos: casas precárias, muitas sobre córregos, quase sem tratamento de água. Uma realidade presente na maior parte da região norte, conforme mostram dados do IBGE: dos 896mil m³ diários de água distribuídos no Amazonas, 607mil m³ são tratados (90% vai para Manaus).

Mesmo assim, São Gabriel apresenta-se como centro urbano da região conhecida como “Cabeça do Cachorro” (extremo noroeste do Brasil, na fronteira com Colômbia e Venezuela). O Hospital Militar recebe pessoas de diversos outros municípios, transportados até ele por aviões da FAB, por embarcações do exército ou, mais comumente, barcos particulares (em viagens que duram dias e até semanas). “Precisamos de mais recursos para atender melhor e poder buscar mais pessoas”, afirma Major Couto.

Mobilidade precária

A dificuldade de deslocamento é presente em toda a Amazônia. Mesmo a concentração populacional e industrial de Manaus não escondem essa realidade. Não longe da capital, a bacia do Amazonas já inviabiliza o transporte terrestre.

Perante o alto custo do transporte aéreo, o fluvial desponta como solução. “Isso implica que há lugares em que só as Forças Armadas conseguem chegar para levar mantimentos e médicos”, disse o General Cerqueira.

Na área do CMA (42% do Brasil) a realização de transporte (de carga e de pessoas) é feito na seguinte proporção: 86% pelo Centro de Embarcações do CMA (Cecma); 12% pela Força Aérea Brasileira (FAB) e 2% por diversos meios civis.

O comandante do Cecma, Coronel Fernando Paranhos, explica que as funções do Centro de Embarcações são, principalmente, apoiar o treinamento das tropas na selva e patrulhar as águas do CMA. “O que envolve até troca de tiros com traficantes e contrabandistas”, diz. Mas, os 86% de transporte realizados pelo Cecma incluem fugas a essa rotina.

Paranhos conta que o Cecma transporta suprimentos alimentares e médicos para comunidades afastadas, em lugares de difícil acesso. Num último exemplo de atividade realizada pelo exército para cobrir a falta de estrutura da região norte, ele cita: “também trabalhamos nas eleições, transportando urnas até os eleitores e vice-versa”.

(*) Da Agência Repórter Social

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