Rússia sacramenta partição da Geórgia

Em desafio ao Ocidente, Medvedev reconhece independência da Ossétia do Sul e da Abkházia; Bush ataca "decisão irresponsável"

Presidente russo diz não temer nova Guerra Fria; Geórgia, aliada dos EUA, compara iniciativa russa às anexações dos nazistas



DA REDAÇÃO

A Rússia reconheceu ontem a independência de dois territórios autonomistas da Geórgia, a Ossétia do Sul e a Abkházia, desencadeando duras críticas da União Européia e dos Estados Unidos. O presidente russo, Dmitri Medvedev, disse não ter medo de uma nova Guerra Fria e afirmou que, embora não a queira, caberia agora aos ocidentais evitá-la: "Se querem manter as boas relações com a Rússia, compreenderão as razões da nossa decisão".

O presidente americano, George W. Bush, lançou um apelo para que Medvedev reconsidere o que chamou de "decisão irresponsável" e disse que Moscou "agrava as tensões". Bush também exortou Moscou a respeitar a integridade territorial da ex-república soviética, que os EUA colocaram em rota de adesão à Otan, a aliança militar ocidental.

A decisão de Medvedev se segue ao conflito iniciado no último dia 7, quando a Geórgia invadiu a russófila Ossétia do Sul, desde 1992 sob proteção de Moscou. A Rússia, em resposta, retomou o território e ainda ocupou militarmente parte da Geórgia.

O conflito de seis dias terminou com um cessar-fogo negociado pela União Européia (UE) que na prática equivaleu a uma rendição georgiana. O plano permitiu que Moscou ocupasse uma zona-tampão dentro da Geórgia, junto aos territórios sul-ossetiano e abhkázio.

Anteontem, a Câmara dos Deputados russa, de ampla maioria governista, havia recomendado o reconhecimento da independência dos dois territórios. O sinal de alerta eriçou a UE, que já havia convocado para 1º de setembro cúpula sobre a situação no Cáucaso.

Desde que qualificaram de "desproporcional" a reação russa à operação georgiana do dia 7, tanto os EUA quanto a UE subiram a retórica contra a Rússia, mas as medidas práticas não foram além da suspensão da cooperação no âmbito da Otan e da ameaça de atrasar o ingresso russo na OMC (Organização Mundial do Comércio).

"Salvar vidas"

Ontem, Medvedev disse que o reconhecimento da independência dos dois territórios "não foi uma opção tranqüila", mas "a única saída para que salvemos a vida das pessoas". Referia-se à versão sul-ossetiana de que a Geórgia pretende promover uma "limpeza étnica" na região de 70 mil habitantes.

A decisão russa enfraquece ainda mais a Geórgia, que é ponto de passagem para dutos que suprem a Europa de gás e petróleo e também uma encruzilhada geográfica para o Oriente Médio e a Ásia Central.

Em Tbilisi, a capital georgiana, o presidente Mikhail Saakashvili declarou que "é a primeira vez na Europa, desde a Alemanha nazista e a União Soviética sob Stálin, que um grande país procura anexar o território que pertence a um outro".

A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, qualificou o reconhecimento de "lamentável". A chanceler alemã, Angela Merkel - em geral menos agressiva com Moscou -, declarou que a iniciativa de Medvedev era "absolutamente inaceitável".

O chefe da diplomacia britânica, David Miliband, disse estar articulando uma visita de chanceleres à Ucrânia -que, a exemplo da Geórgia, pretende ingressar na Otan - para que se crie "uma ampla coalizão contra a agressão russa à Geórgia".

A França, que ocupa a presidência da UE, disse que a decisão "é contrária aos princípios da soberania e da integridade territorial" do país caucasiano.

Masha Lipman, especialista no Centro Carnegie de Moscou, disse acreditar que o governo russo optou pelo confronto com o Ocidente. Prova disso: a acusação, feita ontem por Medvedev, de que os EUA estão desembarcando armas na Geórgia, sob o pretexto de ajuda humanitária. A Casa Branca chamou a acusação de "ridícula".

Com agências internacionais

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