Acordo contra a Guerra Fria

Obama envia carta a Moscou na qual sugere abrir mão do escudo antimísseis no Leste Europeu em troca de pressão sobre o Irã, mas descarta “barganha”. Líderes se reúnem em abril para costurar aliança



Isabel Fleck
Da equipe do Correio

O projeto de construção de um escudo antimísseis no Leste Europeu deixado de herança por George W. Bush parece ter se tornado a primeira grande moeda de troca entre o governo de Barack Obama e Moscou. Ciente do peso econômico e diplomático de um sistema de defesa como esse, o presidente norte-americano enviou, em fevereiro passado, uma carta ao colega russo, Dmitri Medvedev, na qual se mostra disposto a abrir mão do escudo se o Kremlin ajudar Washington a pressionar o Irã pelo fim de seu programa nuclear. Ontem, Obama tentou amenizar a notícia, divulgada pelo jornal americano The New York Times, dizendo que a mensagem a Medvedev não foi uma “barganha”. O presidente russo, por sua vez, se disse pronto a “cooperar sobre o Irã”, mas descartou qualquer relação de sua atuação com a suspensão do sistema de defesa a ser construído na vizinhança.

“O que disse nesta carta é a mesma coisa que eu disse publicamente: que o sistema de defesa antimísseis na Europa é dirigido contra o Irã, e não contra a Rússia. (…) Também disse que o fato de o Irã reduzir a determinação em possuir armas nucleares também diminui a pressão, ou a necessidade de ter um sistema de defesa antimísseis”, afirmou Obama a jornalistas antes de uma reunião com o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, na Casa Branca.

Obama declarou que é hora de os EUA “redefinirem ou reiniciarem” a sua relação com Moscou, um aceno positivo em direção às relações que voltaram a ficar mais tensas nos últimos anos. “A Rússia precisa entender o nosso comprometimento inabalável com a independência e a segurança de países como a Polônia e a República Tcheca”, destacou Obama. “Por outro lado, temos áreas de interesse comum”, completou.

Medvedev admitiu que tem trocado telefonemas e correspondências com o americano, mas negou estar “negociando” a suspensão do escudo antimísseis, que seria instalado nos dois países do Leste Europeu citados por Obama. “Se estamos falando de algum tipo de troca, o assunto não foi apresentado desta maneira, porque isso seria contraproducente”, pontuou o premiê russo, durante visita à Espanha. Segundo ele, o Kremlin “já está trabalhando de perto” com os EUA sobre o prograna nuclear de Teerã.

Prioridade

Para o presidente da Universidade Americana em Moscou, Edward Lozansky, a possível oferta feita na carta confirmaria as intenções demonstradas pelo democrata durante a campanha. “Já era certo que o escudo antimísseis não seria uma prioridade para Obama, levando em conta a sua eficácia questionável e os enormes custos. Portanto, ele pode abandonar esse projeto e usá-lo como moeda de troca para obter algo da Rússia, como a ajuda em relação ao Irã e no Afeganistão”, opina Lozansky.

Segundo o especialista, isso despertaria a oposição da poderosa indústria bélica e dos lobistas anti-Rússia. “Mas os altos índices de aprovação de Obama permitiriam a ele ignorá-los por agora”, avalia.

Depois de amanhã, a secretária de Estado, Hillary Clinton, se reunirá com o chanceler russo, Serguei Lavrov, em Genebra, para conversar sobre a eventualidade de uma nova proposta para substituir o acordo bilateral de desarmamento nuclear Start-1, que expira em dezembro deste ano. Já Obama e Medvedev se encontrarão em Londres, no dia 2 de abril, durante a cúpula do G-20.

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