Forças Olímpicas Armadas

Elite de atletas do Brasil é "incorporada" para disputar Jogos Mundiais Militares no Rio

Fábio Juppa – O Globo

Para deixar Afogados da Ingazeira, no coração do sertão pernambucano, e ganhar o mundo, Yane Marques passou por inúmeras provações. Teve de aprender princípios básicos de esgrima, tiro, equitação e aperfeiçoar seu estilo pouco convencional de nadar e correr. Em 2007, foi medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos e, no domingo passado, vice-campeã mundial de pentatlo moderno, ficando à frente da alemã Lena Schoneborn e da britânica Heather Fell, respectivamente campeã e vice olímpicas em Pequim. Desde agosto de 2008, porém, vive sem o patrocínio da Celpe, a estatal de energia de Pernambuco. Há seis meses, sustentava-se com R$1.100 do Bolsa-Atleta, até se tornar sargento da 7ª Região do Exército, em Recife, que lhe garantiu um soldo de R$2 mil mensais. Em 2011, Yane será uma das estrelas brasileiras na quinta edição dos Jogos Mundiais Militares, os "Jogos da Paz", lançados oficialmente ontem, no Rio.

Concebido por autoridades civis como evento-teste para as Olimpíadas de 2016, cuja candidatura da cidade é favorita no pleito de 2 de outubro, em Copenhague, os Jogos Mundiais Militares, orçados em R$1 bilhão, dinheiro do governo federal, são parte de uma cadeia de eventos que inclui o Pan 2007, a Copa das Confederações (2013), a Copa de 2014 e, até 2016, visa a inserir o país na rota principal do esporte mundial. Com previsão de participação de cerca de 100 países e seis mil atletas, tem causado uma revolução silenciosa no segmento. Atraídos pelo orçamento generoso das Forças Armadas, que garante recursos para treinamentos e viagens, e por boa infraestrutura, atletas de diversas modalidades estão se "militarizando". O processo, comum em países da Europa e da Ásia, cujas delegações olímpicas são formadas, em maioria, por militares, foi iniciado em março pela Marinha, com apoio irrestrito do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), chegou ao Exército e deve aterrisar no pátio da Aeronáutica em breve.

- Potências como China, Rússia, Alemanha e Itália montam sua base esportiva com estrutura militar - explica o nadador Luiz Lima, que divide com o major Siqueira, do Exército, a orientação da equipe de natação. - O Alain Bernard (ex-recordista mundial dos 100m livre) está no time francês.

Atletas olímpicos se tornarão sargentos

Atualmente dedicado à maratona aquática, prova que não consta do programa militar, Luiz Lima teve como primeira missão ajudar na seleção de nadadores de alto rendimento que enviaram currículos para o Exército após lançamento de edital público. Foram selecionados 23, que a partir dos próximos dias 23 e 24 farão provas práticas e inspeção de saúde. Entre eles estão Kaio Márcio, Gabriel Mangabeira, Poliana Okimoto, Nicolas Oliveira, Henrique Barbosa e Monique Ferreira. Natália Falavigna, bronze nos Jogos Olímpicos e campeã do mundo de 2005, está entre as selecionadas do taekwondo. Os velocista Vicente Lenílson e a saltadora Keila Costa integram o time do atletismo; o judô vem, entre outros, com Leandro Guilheiro, João Derly e Tiago Camilo, e o vôlei de praia com o campeão olímpico Emanuel. Um segundo edital está a caminho. Os atletas, se aprovados, serão nomeados sargentos temporários do Exército por período mínimo de um ano e máximo de sete, com direito a usufruir dos benefícios da vida militar, incluindo o recebimento de soldo de R$2 mil.

- Nosso interesse é que seja atleta e compita pelo Exército - explica o major Siqueira.

Indagado sobre a participação das Forças Armadas no processo de formação de atletas e massificação do esporte no Brasil, o major é reticente. Adverte que a questão é política, envolve custos e depende da disposição do governo federal em assumi-los. Numa comparação com o programa de militarização de atletas feitos pela Marinha, porém, vê vantagens para o Exército:

- Primeiramente, pagamos melhor. Aqui, os atletas são sargentos. Lá, cabos. E temos mais conhecimentos do meio (esportivo). Mas a Marinha também merece elogios.

As competições ocorrerão entre 16 e 24 de julho de 2011, nas instalações do Pan (Complexo de Deodoro, Engenhão, Parque Aquático Maria Lenk, Maracanãnzinho e Praia de Copacabana). Serão 38 modalidades de 20 esportes. Ontem, no lançamento dos Jogos, no Forte de São João, na Urca, estiveram presentes o prefeito Eduardo Paes, o governador Sérgio Cabral e o ministro da Defesa, Nelson Jobim. Mas foram do major-general Gianni Gola, italiano que preside o Conselho Internacional do Esporte Militar (CISM), as palavras que reforçam a crença de que todo o esforço terá resultado já no dia 2 de outubro:

- Muitos delegados do Comitê Olímpico acham que (a disputa pela sede de 2016) é ocasião importante para provar que a universalidade não é um conceito teórico. É hora de abrir portas para novas áreas.

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