Parceria para o futuro

Acordo pode colocar a indústria aeronáutica brasileira em novo patamar no mundo
 
Estado de Minas
 
Apesar de não completamente oficial, a decisão do governo brasileiro de fechar o acordo com a França para a compra de 36 caças GIE Rafale, da empresa Dassault, foi um bom negócio para os dois lados. A escolha não foi oficializada, pois o prazo da licitação – em que disputam ainda o caça sueco Gripen, fabricado pela Saab, e o F-18 Super Hornet, da americana Boeing – termina em outubro e ainda faltam pareceres técnicos. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, declarou ontem no Congresso que a escolha é uma decisão política e não está fechada. Para ele, o governo ainda não bateu o martelo. No entanto, a julgar pelo entusiasmo com o qual o governo e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vêm defendendo a parceria com a França, as chances de a decisão favorecer os franceses é bastante alta.
 
O reequipamento das Forças Armadas inclui um acordo já firmado com os franceses para a compra de quatro submarinos convencionais e 50 helicópteros EC-725, além da produção conjunta no Brasil de um submarino nuclear. Os gastos totais chegam a cerca de R$ 37,5 bilhões, sendo R$ 23 bilhões para os submarinos e helicópteros e o restante para os caças. A entrega deve começar a ser feita em 2012 e durar até 2020. O Brasil afirma ainda que pode expandir a frota em até 100 unidades nos próximos 20 anos. De qualquer maneira, os preços ainda não estão definidos e o total vai depender dos equipamentos e armamentos complementares para cada um dos produtos.

A vantagem do acordo para a compra dos aviões tem sido salientada pelos dois lados. A França se dispôs a transferir a tecnologia, fato que o especialista Jean Paul Hebert, da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris, aponta como recorrente. Segundo ele, esse sistema permite conceder ao país cliente o direito de produzir aeronaves ou componentes e de ter acesso à tecnologia dos produtos que compra.

A fabricante do Rafale, Dassault, se declarou disposta a responder a essa exigência brasileira, baseando-se em sua "longa história em matéria de transferência de tecnologia e de cooperação industrial, que remonta aos anos 60 e que começou com o Mirage 3". "Nunca tivemos problemas", disse uma fonte do governo francês. No entanto, o alcance da transferência de tecnologia proposta pela Dassault é secreto. "Os brasileiros nos pedirão muito. Será preciso encontrar um equilíbrio", considerou a fonte.

As áreas mais delicadas são as "forças tecnológicas" do avião, como tudo o que permitirá atacar, como radares, mísseis, visores de capacete, sistema de alvo e eletrônica de bordo, explicou um alto responsável da Força Aérea francesa. Os "códigos-fonte" dos computadores também são decisivos, pois permitem bloquear seu funcionamento. "Fabricar um avião em um país não significa que serão fornecidos os segredos de fabricação de um radar", explicou essa autoridade.

O governo brasileiro diz que a proposta dessa transferência de tecnologia é inédita e vai permitir a fabricação de aeronaves no país, provavelmente a cargo da Embraer, que já fez a modernização de aviões militares para a Força Aérea Brasileira (FAB) e está de olho na ampliação da sua fatia no mercado de aviões militares. Como moeda de troca, o governo francês se dispôs a negociar a compra de 10 aviões de transporte militar brasileiros KC-390, o Hércules, da Embraer, para substituir os C130 Hércules americanos. As aeronaves seriam entregues a partir de 2015.

A notícia do provável negócio – e a consequente entrada de bilhões na economia francesa – foi comemorada na Europa. A Dassault estava endividada e à beira da falência e a venda significa uma sobrevida para o consórcio, que, além desta companhia, envolve 1,5 mil outras empresas. Em um momento de crise mundial, as fabricantes de aeronaves, tanto civis como militares, amargam grandes perdas e projetam crescimento apenas para o fim de 2011.

O presidente da Turbomeca do Brasil, François Haas, controlada pelo francês Grupo Safran, também comemorou. Com faturamento anual de R$ 200 milhões no país, a companhia tem uma unidade de reparos e manutenção de turbinas em Xerém, no Rio de Janeiro. "Eu não tenho números, mas tenho certeza de que, com todos esses programas, podemos multiplicar (o faturamento da Turbomeca no Brasil) por 10, pelo menos", disse. "Nosso objetivo é transformar o Rio de Janeiro em um polo de excelência em turbinas aeronáuticas", completou, acrescentando que a unidade deve ser ampliada para cobrir a demanda.

VANTAGEM EM MÃO DUPLA

A parceria com os franceses representa a oportunidade de um grande salto tecnológico na história da indústria aeronáutica brasileira. Com a transferência de tecnologia, a Embraer, que já vem mostrando um desempenho brilhante no mercado internacional, vai aumentar seu poder de fogo. O contrato não elemina a possibilidade de outras parcerias futuras e ainda prevê a compra pela França de 10 aviões de transporte militar KC-390, projetados e fabricados pela Embraer para substituir os velhos turbo-hélices Hércules C-130, ainda em uso pela nossa Força Aérea.

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