Pré-sal e Amazônia para justificar acordo militar

Lula recebe Sarkozy e assina compra de 36 aviões de combate da França; pacote, que inclui submarinos e helicópteros, custará R$ 31,1 bi



Bernardo Mello Franco e Luiza Damé
BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva confirmou ontem que o Brasil comprará 36 aviões de combate Rafale, da fabricante francesa Dassault. O anúncio foi feito ao lado do presidente francês, Nicolas Sarkozy, que veio ao país para fechar o negócio, estimado em R$ 7 bilhões, e ontem assistiu ao desfile de Sete de Setembro. A escolha encerra uma batalha comercial iniciada há 11 anos em torno do reaparelhamento da Força Aérea Brasileira (FAB). Foram derrotados os caças Gripen, da sueca Saab, e F-18, da americana Boeing. No total, o Brasil deve gastar R$ 31,1 bilhões em acordos com a França, incluindo a compra de submarinos e helicópteros.

Para justificar os altos investimentos em compras para as Forças Armadas, o presidente recorreu ao discurso nacionalista. Citou a descoberta das reservas de petróleo na camada do pré-sal e a necessidade de proteger as riquezas da Amazônia:

— O Brasil é um país que prima pela paz. Ao mesmo tempo, temos 300 milhões de hectares de terras na Amazônia que precisamos preservar.

E agora descobrimos outra riqueza que é o pré-sal. Deve sempre passar pela nossa cabeça a ideia de que o petróleo já foi motivo de muitas guerras, muitos conflitos. E o Brasil não quer guerra nem conflito.

Segundo Lula, os caças franceses foram escolhidos porque o país foi o único a se comprometer a transferir tecnologia aeronáutica para a FAB:

— Decidimos começar a negociação para a compra do Rafale. Para nós, o avião é importante, mas importante mesmo é ter a tecnologia para que possamos produzir esse avião no país. É isso que estamos negociando.

No fundo, o Brasil quer comprar um avião com a garantia de uso e transferência total da tecnologia.

“Queremos construir e vender juntos”

Como contrapartida à compra dos caças, Sarkozy anunciou a intenção do governo francês de ajudar a desenvolver e comprar dez unidades do futuro avião de transporte militar KC-390, a ser produzido no Brasil pela Embraer. O modelo deve substituir os antigos Hércules C-130 da Aeronáutica.

Os presidentes não anunciaram os custos dessa operação.

Segundo Lula, a assinatura dos acordos inaugura uma parceria militar estratégica, com a cooperação entre os dois países. Além da compra dos caças, o acordo militar com a França inclui R$ 19 bilhões com a construção de submarinos — quatro convencionais e um nuclear — e R$ 5,1 bilhões com a fabricação de 50 helicópteros.

— A França não quer só vender para o Brasil, e o Brasil não quer só vender para a França. Queremos pensar juntos, criar juntos e construir juntos. Se possível, vender juntos — disse, arrancando gargalhadas dos franceses.

Animado com o anúncio da compra dos caças, Sarkozy enalteceu os investimentos brasileiros na área militar e disse que o país pode se tornar o principal parceiro da França no setor:

— Um país forte é um país que pode se defender. Os grandes atores do mundo têm uma política de defesa ambiciosa. Se existe um país no mundo onde há espaço para a tecnologia francesa, é o Brasil. Compartilhar tecnologia não nos dá medo, porque o tempo da colonização já acabou.

Sorridente, Sarkozy se desmanchou em elogios a Lula, a quem chamou de amigo, líder e “homem especial”. Em entrevista ao lado de Lula no Palácio da Alvorada, o francês manifestou apoio ao Brasil em quase todas as frentes de batalha do Itamaraty, desde a luta por uma vaga no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas até a candidatura do Rio para sediar as Olimpíadas de 2016.

— O mundo tem necessidade da liderança do presidente Lula, por seu amor pela África, suas convicções democráticas e pelo exemplo que ele representa com sua trajetória. Tenho orgulho de ser seu amigo — disse.

A novela dos caças se arrastava desde 1998, quando a Aeronáutica começou o projeto FX, no governo Fernando Henrique. O processo estava em fase final. Em 2003, com três dias no cargo, Lula suspendeu a licitação, na época orçada em US$ 700 milhões, para a compra de 12 aviões, dizendo que destinaria o dinheiro ao Fome Zero.

Em novembro de 2007, a Aeronáutica anunciou a retomada do programa, com o título de FX-2.

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