Dassault oferece itens adicionais para tentar vender o Rafale para o Brasil

O Globo Online
 
Na reta final da disputa por um contrato de venda de 36 jatos de combate à Força Aérea Brasileira (FAB), o governo da França – cuja empresa Dassault concorre com o seu modelo Rafale contra a americana Boeing e a sueca Saab – acrescentou alguns itens ao pacote que já havia oferecido ao Brasil. Um deles é a possibilidade de, ao longo do acordo, a Embraer vir a desenvolver uma versão mais moderna daquele avião e, eventualmente, exportá-lo para a própria França.

Tal possibilidade está embutida no fato de que na prometida transferência de tecnologia daquela aeronave, sem quaisquer restrições, estaria incluída a cessão dos seus códigos-fonte – coração e cérebro do avião. São as linhas de código dos programas que controlam tanto o sistema de armas (mísseis e computadores de bordo), quanto os radares, os motores, e superfícies móveis (como os lemes) do caça.

" A FAB terá toda a tecnologia do Rafale, inclusive os chamados códigos-fonte. Com eles ela poderá tanto modificar a aeronave quanto fazer, por exemplo, um Super Rafale "

Essa promessa, mais a garantia de várias outras vantagens, foram apresentadas ao governo por um enviado especial do presidente Nicolás Sarkozy, durante uma discreta visita de dois dias ao Brasil, na semana passada: o almirante Edouard Guillaud. Ele é "chefe do estado maior particular do presidente da República".

No acordo que propusemos ao governo brasileiro está escrito que a FAB terá toda a tecnologia do Rafale, inclusive os chamados códigos-fonte. Com eles ela poderá tanto modificar a aeronave quanto fazer, por exemplo, um Super Rafale, uma nova versão – disse Guillaud em entrevista exclusiva ao GLOBO. "Tratam-se de especificações técnicas, que vão desde as mais gerais até o último parafuso do trem de pouso. Isso se chama cessão de segredo industrial" – insistiu.

Guillaud conversou confidencialmente com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, no hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro. Horas depois, na entrevista, depois de comentar que "um avião de combate sem armamento é um avião de aeroclube, muito caro", ele revelou que, no espírito da parceria estratégica França-Brasil assinado em dezembro passado, garantiu ao governo brasileiro que a França está preparada para ir mais além: se o Rafale ganhar a concorrência, o Brasil poderia produzir inclusive as armas para essa aeronave.

"A indústria francesa de mísseis também decidiu compartilhar com o Brasil os seus segredos de fabricação. Isso mostra que não estamos falando apenas de um avião, e sim de todo um sistema global para o qual propomos a transferência de tecnologia."

Guillaud contou, ainda, que reforçou a proposta francesa com um plano de intercâmbio de oficiais de nível superior, em especial dos estados maiores das forças armadas de ambos os países:

"Não estamos conversando como comerciantes. É um raciocínio estratégico, que pode ir muito além disso – afirmou."

Guillaud veio ao Brasil em companhia de Damien Loras, conselheiro de Sarkozy para as Américas. Durante a entrevista ele também enfatizou alguns pontos da proposta de seu país, em especial o de que a transferência de tecnologia seria "naturalmente gratuita", e não um custo um adicional ao valor do avião:

"O valor dessa transferência sem precedentes representa anos de experiência, de desenvolvimentos, de estudos e de know-how (concepção e fabricação). Esse valor é estimado entre cinco e sete bilhões de euros, ou seja, mais do que o montante do contrato" – ressaltou Loras.

Apesar dessa menção ao preço, tanto ele quanto Guillaud evitaram mencionar cifras específicas sobre o custo do Rafale – a não ser o fato de que ele seria 4% mais caro que o F-18 Super Hornet, da americana Boeing. Tal diferença, alegaram, desapareceria ao longo dos 15 anos de contrato a ser firmado com o Brasil, por conta de flutuações cambiais durante esse período.

"Independência e autonomia sempre demandam investimento. A própria França pagou um preço para ser autônoma e não depender do fornecimento de outros países na área militar. Aceitamos investir mais, um pouco mais, para dominar o nosso destino. E o Brasil agora tem chance de fazer o mesmo: tem economia sólida, vontade política, e busca os meios de se fazer respeitar e de ser respeitado. É aí que intervém a ferramenta militar" – argumentou Guillaud.

A estimativa é a de que o pacote francês custaria cerca de 5,5 bilhões de euros. O almirante, negando-se a precisar um valor, disse que, na prática, o contribuinte brasileiro pagaria pelos caças um preço equivalente ao seu custo para os próprios franceses. Guillaud insinuou que, num último momento, poderia haver algum tipo de acerto em relação ao valor do contrato:

"Estamos numa competição e aquele que for escolhido (do ponto de vista técnico-operacional) vai entrar numa negociação comercial. Não vim aqui em nome do fabricante (Dassault) mas, sim, do presidente da República. O que posso lhe dizer é que no momento da negociação o estado francês estará presente. O presidente Sarkozy se comprometeu a fazer isso. Trata-se de um compromisso por escrito, e firme" – disse Guillaud.

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem