Uma OTAN mais agressiva

Marcelo Rech - InfoRel

Em novembro do ano passado, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), criada em 1949, pelos Estados Unidos, no contexto da Guerra Fria, aprovou um novo conceito estratégico que a torna mais agressiva.

A cada dez anos, a OTAN revisa essa política e promove as atualizações que julga necessárias de acordo com os interesses majoritários da aliança.

Dentre os vários temas discutidos, a Cúpula de Lisboa terminou com a aprovação de um documento que prevê a criação de um escudo antimísseis nos moldes do projeto instituído por Washington.

Para as entidades de defesa da paz mundial, a OTAN já é o principal instrumento de militarização e guerra a serviço dos Estados Unidos e de seus aliados europeus.

O secretário-geral da Aliança Atlântica, Anders Fogh Rasmussen, destacou que a Cúpula de Lisboa, constitui "um novo começo" nas relações com Moscou, após o impasse gerado pelo conflito russo-georgiano de agosto de 2008.

Rasmussen também considera que a intervenção no Afeganistão foi um erro, na medida em que a Aliança Atlântica subestimou o desafio e não disponibilizou os recursos necessários: “em retrospectiva, penso que subestimamos o desafio e a nossa operação no Afeganistão não dispunha de recursos suficientes, nesse sentido a minha resposta é que sim, que foi um erro”, admitiu em entrevista coletiva no ano passado.

O fato concreto é que o novo Conceito Estratégico que define a política da OTAN para a próxima década pode ter um impacto negativo em relação à segurança nacional da Rússia.

A OTAN quer manter o papel de principal entidade provedora de paz e segurança e esse papel implica em “assegurar proteção, prevenção de crises e regulação de conflitos no mundo inteiro através de operações militares sob orientação da Aliança”.

Além disso, observou-se em Lisboa que a OTAN possui Forças Armadas capazes de cooperar em qualquer situação e que a sua redução sequer foi cogitada.

O que se pretende mesmo é dotar essas forças de condições para conduzir simultaneamente “operações principais combinadas” (tais como no Afeganistão e Iraque), bem como “várias operações menores”, as quais podem ser lançadas para assegurar a defesa conjunta e responder a crises.

Tais pretensões suscitam dúvidas, como as que a Rússia alimenta.

Não à toa, o representante permanente da Rússia junto à OTAN, Dmitry Rogozin, ter afirmado que “dará um milhão de dólares a alguém que possa comprovar que a OTAN não conduz um planejamento militar contra a Rússia”.

Além disso, o novo Conceito Estratégico confirma a tarefa da OTAN em conservar as suas armas nucleares enquanto permanecem em outros países.

A segurança de todos os estados-membros da OTAN é garantida pelo potencial nuclear estratégico dos Estados Unidos, do Reino Unido e da França.

Por outro lado, nenhuma menção quanto à remoção de armas nucleares norte-americanas da Europa, embora isso represente uma grave violação do Tratado da Não-Proliferação de Armas Nucleares.

Com muito esforço, lograram prometer prover “condições” para futuras reduções das armas nucleares no continente europeu. Também, nenhum documento da cúpula fala sobre o abandono da doutrina da OTAN de “arma nuclear de golpe inicial”.

Decidiu-se ainda pela criação de um sistema conjunto de defesa de míssil até junho de 2011, assunto que será discutido no próximo encontro de ministros de Defesa de países membros da Aliança.

Os participantes da cúpula também reconheceram a conexão entre o sistema de defesa de míssil da OTAN e a ‘Aproximação Adaptável em fases para Defesa de Míssil na Europa’, adotada em setembro passado pelo governo dos Estados Unidos, a qual é consideravelmente superior por sua informação e componentes de inteligência ao antigo Sistema de Defesa de Míssil norte-americano, que George W. Bush quis desdobrar na Polônia e na República Checa.

Essa decisão constitui uma ameaça direta ao equilíbrio existente da intimidação nuclear na Europa.

As diferenças entre OTAN e Rússia em questões que se relacionam com a expansão da Aliança, por exemplo, não sofreram qualquer mudança.

A OTAN buscou ainda fortalecer a parceria com a Ucrânia e a Geórgia através de comissões conjuntas apropriadas, que atuaram dentro da aliança.

Moscou reclama ademais, da indiferença em relação à sua proposta de um novo tratado de segurança para a Europa, mesmo reconhecendo a importância da oferta feita pela OTAN quanto ao estreitamento das relações com o aumento da cooperação no campo da defesa de míssil, contra-terrorismo e pirataria, e políticas de drogas.

Embora a Cúpula de Lisboa tenha sido encerrada com o enaltecimento de que a OTAN não representa uma ameaça à Rússia, não é esse o sentimento em Moscou.

Com exceção da retórica, a Rússia não tem razão alguma para crer que está segura. A confiança não se constrói apenas com palavras, mas também com gestos concretos.

O novo Conceito Estratégico pode ser reduzido a afirmações meramente políticas, as quais, a própria OTAN quase nunca implementa na prática.

Marcelo Rech é jornalista, editor do InfoRel e especialista em Relações Internacionais, Estratégias e Políticas de Defesa e Terrorismo e Contra-insurgência.

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