Arma química, o fantasma da guerra

Documentos revelam envio de máscaras de gás e trajes especiais para redutos de Kadafi
 

Renata Tranches - Correio Braziliense
 
Um dia depois de serem divulgadas informações sobre o desaparecimento de milhares de mísseis terra-ar em território líbio, surgiu ontem a preocupação de que o regime de Muamar Kadafi tenha em seu poder armas químicas. O arsenal poderia ser empregado por suas forças, em uma última tentativa de barrar os avanços dos rebeldes. No mesmo dia, o ditador, ainda foragido, negou em nova mensagem de áudio uma eventual fuga para o Níger e chamou de "guerra psicológica e mentiras" as especulações sobre seu paradeiro.

 
A informação do risco de ataque com armas químicas foi divulgada pelo jornal norte-americano The Washington Post, que citou documentos sobre o envio de milhares de máscaras de gás e de trajes especiais de proteção para todos os redutos controlados por forças leais a Kadafi. A preocupação, segundo o jornal, é de que os simpatizantes do regime usem o mortífero gás mostarda contra os rebeldes e a população.

 
Segundo a Organização pela Proibição de Armas Químicas, órgão internacional de monitoramento que trabalha com a ONU, acredita-se que haja mais de 11t de gás mostarda no país. O Pentágono e a organização garantem, porém, que os resquícios do armamento estão seguros. Na opinião do especialista e diretor do Programa de Não Proliferação de Armas Químicas e Biológicas do Centro James Martin para Estudos de Não Proliferação (em Monterey, EUA), Raymond Zilinskas, ainda que houvesse o acesso a esse resíduo químico, seu uso pelas forças de Kadafi seria arriscado e quase impossível.

 
Kadafi utilizou armas químicas durante a guerra com o vizinho Chade, em 1987. À época, o país acusou o regime de ter bombardeado forças do governo central e dos rebeldes com gás tóxico e napalm.

 
A Líbia também teria empregado gás mostarda, depositado em bombas lançadas por aviões AN-26, na fase final do conflito. Em 2003, quando buscava a aproximação com o Ocidente, o líder líbio aceitou desmantelar o programa de armas de destruição em massa, ordenando a eliminação de 3,3 mil morteiros de artilharia.

 
Zilinskas explicou, em entrevista ao Correio, que a ação do governo líbio deixou para trás agentes precursores, uma vez que o processo de incineração para eliminar o gás é muito complexo e caro. O especialista reforça que, mesmo que as tropas do ditador tivessem acesso a esses agentes precursores, seu manuseio é muito perigoso e colocaria o operador em risco. "Se eles têm alguma coisa? Eu diria que sim, mas seu uso seria muito perigoso para quem estivesse operando, mais até do que para as vítimas em potencial", afirmou.

 
Sem logística
 

Além disso, ressaltou Zilinskas, seriam necessárias armas especiais para colocar o gás. As forças de Kadafi precisariam levá-las até uma aeronave, ultrapassar as linhas inimigas, contar com boas condições meteorológicas e só então tentar o ataque. "Tudo isso é extremamente problemático agora para o regime", pondera o especialista. Mas apesar de ter seus recursos debilitados, Kadafi segue na defensiva. Em mensagem divulgada pela tevê Al-Rai, de Damasco, ele disse que as tropas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) serão vencidas e que os boatos sobre sua localização fazem parte de uma "guerra psicológica". "Já não resta a eles mais nada além da guerra psicológica e das mentiras."
 
Com a prisão decretada pelo Tribunal Penal Internacional em junho, Kadafi poderá passar a ser procurado pela Interpol. O promotor da Corte de Haia, Luis Moreno-Ocampo, pediu à polícia internacional que emita um mandado de busca do líder, acusado de crimes contra a humanidade, assassinato e perseguição.

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