Aiatolás na mira

À espera de relatório da agência nuclear da ONU, Israel volta a ameaçar com um ataque unilateral a instalações nucleares iranianas. Opção divide a opinião pública e alimenta temores de guerra regional
Tatiana Sabadini – Correio Braziliense
Em um inédito debate público, Israel trouxe de volta a sombra de um ataque unilateral contra o Irã e o medo de uma guerra que poderia envolver todo o Oriente Médio. Nos últimos dias, enquanto os militares anunciavam testes com mísseis de longo alcance, a imprensa revelava que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e o titular da Defesa, Ehud Barak, estariam em campanha para conquistar o apoio da maioria do gabinete a um plano para destruir instalações nucleares iranianas. A discussão se desenrola a menos de uma semana da divulgação de um relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) sobre o programa atômico iraniano. Os Estados Unidos afirmaram que a pressão sobre o regime dos aiatolás deve continuar, mas voltaram a se referir com cautela a uma possível intervenção militar.
Netanyahu e Barak teriam conquistado o apoio do chanceler Avigdor Lieberman para um ataque aéreo dirigido contra usinas e outras instalações do Irã, em especial as de enriquecimento de urânio.
Segundo o jornal Haaretz, a maioria do gabinete é a favor de sanções econômicas, mas reluta em avalizar o plano de ataque ao menos antes de ser divulgado o relatório da agência nuclear das Nações Unidas (ONU), na próxima terça-feira. “Um Irã nuclear constitui em uma ameaça grave para o Oriente Médio e o resto do mundo. E, claro, é um perigo imediato para nós”, argumentou o premiê durante debate no parlamento, na última segunda-feira.
A discussão coincide, para Israel, com a escalada do duelo diplomático travado nas Nações Unidas contra o pedido de reconhecimento da Autoridade Palestina (AP) como Estado soberano, e sob o impacto da sua admissão na Unesco (agência cultural da ONU). “Neste momento, os israelenses estão isolados internacionalmente e os palestinos conquistaram uma vitória política importante, que foi um fracasso para Israel. Talvez esse fato esteja ajudando a tomada de decisões em relação ao Irã. Um ataque sem um relatório oficial seria uma agressão injustificada, mas, com a crise na Síria e a Primavera Árabe, os palestinos poderiam ficar isolados militarmente”, explica Héctor Luis Saint-Pierre, professor Universidade Estadual Paulista (Unesp) e especialista em segurança internacional.
Para o ministro israelense da Defesa, a opção por um ataque às instalações nucleares do Irã não deve ser debatida abertamente. “Não estamos escondendo nossos pensamentos, mas não podemos discutir certas coisas em público. Precisamos agir e nenhuma opção está fora da mesa. Também acredito na pressão diplomática e na imposição de sanções”, afirmou Barak. Uma pesquisa divulgada pelo Haaretz mostrou que 41% dos israelenses apoiam um ataque aos iranianos, 39% são contra e 20% estão indecisos. No entanto, 80% acreditam que a ação pode desencadear uma guerra regional, envolvendo aliados de Teerã, como os xiitas libaneses do Hezbollah ou os extremistas palestinos do Hamas.
Obama
Com ou sem ataque, o relatório da AIEA deve recolocar na agenda internacional o debate sobre novas sanções contra o Irã. Em Cannes, na França, onde participa da cúpula do G-20, o presidente americano disse que é preciso dar atenção às questões de segurança no Oriente Médio e, em especial, ao regime iraniano. Em conversa com o colega francês, Nicolas Sarkozy, Barack Obama afirmou que ambos concordaram “sobre a necessidade de manter a pressão sem precedentes sobre o Irã”. O Reino Unido também estaria disposto a participar de uma intervenção militar, segundo informações divulgadas pelo jornal The Guardian.
Em Teerã, o governo do presidente Mahmud Ahmadinejad, que enfrenta turbulências políticas domésticas, se disse pronto para responder a qualquer ataque. “Sempre estamos preparados para a guerra. O Irã sempre foi ameaçado por Israel, escutamos isso há oito anos e saberemos nos defender”, garantiu o chanceler Ali Akbar Salehi, falando ao jornal turco Hürriyet.
Punição em série
O Conselho de Segurança da ONU aprovou em meados do ano passado a quarta rodada de sanções ao Irã por se recusar a acatar uma resolução que determina a paralisação das atividades de enriquecimento de urânio. A decisão se seguiu a uma gestão diplomática pela qual Brasil e Turquia convenceram Teerã a enviar o minério para enriquecimento em outro país. A fórmula não foi aceita pelas potências que pressionam o regime islâmico a deter seu programa nuclear.

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