ONU: inação internacional encoraja Assad

Alta comissária de Direitos Humanos diz que regime sírio lançou ofensiva avassaladora contra cidadãos após veto russo

Jason De Crow/ AP – O Globo

NOVA YORK. Encorajado pela inação do Conselho de Segurança da ONU, que foi incapaz de chegar a uma resolução de consenso para tentar controlar a violência na Síria, o regime de Bashar al-Assad decidiu "lançar uma ofensiva aberta num esforço para esmagar a dissidência com uma força avassaladora". A denúncia foi feita na tarde de ontem, em sessão extraordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas para discutir a crise síria, pela alta comissária de Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay. Apesar do alerta, declarações de diplomatas de países-membros do Conselho de Segurança durante o dia de ontem indicam que a inação continuará.

A Rússia, que ao lado da China vetou há cerca de dez dias uma resolução condenando o regime de Assad e ordenando o fim imediato da repressão contra dissidentes, rejeitou ontem nova sugestão da Liga Árabe. No domingo, a entidade propusera o envio de uma missão de paz da ONU para pôr fim à violência na Síria.

- É preciso que a paz retorne antes (do envio de uma missão da ONU). Em outras palavras, é preciso que haja um acordo para um cessar-fogo, mas a tragédia é que os grupos armados que estão enfrentando as forças do regime não são subordinados a ninguém e estão fora de controle - disse o chanceler russo, Sergei Lavrov.

A Rússia, principal fornecedora de armas da Síria, vetou a resolução no Conselho de Segurança justamente por considerar que ela deveria dividir igualmente as responsabilidades pela violência no país entre o regime de Assad e seus opositores. Desta vez, porém, a Rússia não foi a única a expor desagrado com a nova proposta da Liga Árabe.

- Não creio que a solução seja a presença de tropas ocidentais em qualquer função, mesmo que para a manutenção da paz - disse o chanceler britânico, William Hague.

O chanceler francês, Alain Juppé, concordou:

- Achamos que qualquer intervenção militar estrangeira só tornaria pior a situação.

Com as tratativas no âmbito do Conselho de Segurança da ONU emperradas, a única iniciativa diplomática em andamento para tentar pôr fim ao conflito sírio é uma reunião agendada para o dia 24, na Tunísia, do grupo de países amigos da Síria, que inclui potências ocidentais e países árabes. Na proposta de Orçamento enviada ontem ao Congresso, o presidente dos EUA, Barack Obama, incluiu US$ 800 milhões em ajuda financeira aos países atingidos pela chamada Primavera Árabe - não está claro quanto do valor poderia ser usado para garantir ajuda humanitária à população síria, um dos objetivos do grupo de amigos.

Diplomata denuncia "ataque indiscriminado a áreas civis"

Para a alta comissária de Direitos Humanos da ONU, cada dia de inação internacional só piora a situação na Síria.

- Estou particularmente consternada pela matança em andamento em Homs. De acordo com relatos críveis, o Exército sírio bombardeou regiões densamente populadas de Homs no que parece ser um ataque indiscriminado a áreas civis - afirmou a comissária.

Pillay, que renovou o apelo para que o regime de Assad seja denunciado no Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra e contra a Humanidade, acusou o governo sírio de manter cidadãos presos em suas casas sem comida, eletricidade, comunicações e ajuda médica, e de bombardear postos médicos. Iniciada na véspera da votação no Conselho de Segurança da ONU, a ofensiva das forças sírias contra os dissidentes em Homs já deixou mais de 300 mortos, que se somam às 5.400 vítimas contabilizadas pela ONU no ano passado. Também há enfrentamentos cada vez maiores entre tropas governamentais e grupos opositores armados em outras cidades do país. Ontem, esses grupos repeliram uma investida do Exército contra a cidade de Rastan, cujo controle estaria nas mãos de rebeldes desde o mês passado.

O governo sírio atribui a terroristas as ações dos grupos armados e vem rechaçando os apelos internacionais para um cessar-fogo e a abertura de diálogo para a formação de um governo de transição, com a saída de Assad.

O embaixador da Síria na ONU, Bashar Jaafari, que antes da fala de Pillay tentara alegar motivos regimentais para impedir o discurso dela, refutou as denúncias da alta comissária.

- O que a Síria tem feito é tentar restabelecer a segurança e a estabilidade num exercício de seu direito exclusivo de proteger seus cidadãos - disse ele, alegando que a resistência contra o governo é fomentada pelo grupo terrorista islâmico al-Qaeda. - Como a ONU pode combater a al- Qaeda se alguns de seus membros financiam e ajudam membros da al-Qaeda a cometer atos terroristas na Síria?

A Assembleia Geral da ONU deveria votar ainda ontem uma resolução condenando a Síria cujo texto é baseado na proposta vetada por Rússia e China no Conselho de Segurança. Diferentemente do Conselho, não há poder de veto na Assembleia - e suas resoluções não são de cumprimento obrigatório.

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