Procurador reabre casos de desaparecidos na ditadura

Ministério Público Militar usa artifício jurídico para driblar Lei da Anistia

O Globo

RIO - Rubens Paiva, Mário Alves de Souza, Stuart Angel Jones e Carlos Alberto Soares de Freitas foram presos pelos órgãos de segurança em 1971 e desapareceram. Os dois primeiros, segundo testemunhas, foram torturados e mortos no DOI-Codi, na Rua Barão de Mesquita. Stuart Angel foi espancado e arrastado por um carro com a boca no cano de escape na Base Aérea do Galeão. Carlos Alberto, o Beto, morreu na Casa da Morte, centro de tortura clandestino das Forças Armadas em Petrópolis, na Região Serrana do Rio. Os corpos nunca apareceram. Os quatro casos estão entre os 39 do Rio e do Espírito Santo reabertos no Rio pelo promotor da Justiça Militar Otávio Bravo. Ele achou um novo caminho jurídico.

- O Supremo Tribunal Federal equiparou o desaparecimento forçado, quando é feito por agentes do Estado, ao crime de sequestro, que permanece. Só se encerra quando aparece a pessoa ou o corpo.

O crime aconteceu antes de 1979, mas será que terminou antes de 79? Como essas pessoas, inclusive Rubens Paiva, continuam desaparecidas, o raciocínio jurídico é que o sequestro continua em curso. Se o corpo aparecer, então é crime de ocultação de cadáver.

Ele sustenta, com base nisso, que nesses casos não se aplica a Lei da Anistia, que encerrou os crimes praticados antes de 1979. Bravo está tentando recuperar no Supremo Tribunal Militar arquivos antigos, como o inquérito de 1986 sobre o caso Rubens Paiva. Ele foi aberto logo após a redemocratização. Os militares pressionaram e, por decisão da Procuradoria Geral Militar na época, o inquérito foi arquivado. Bravo ainda não obteve os originais desse inquérito.

Procurador quer documentos das Forças Armadas

Para apurar o caso de Carlos Alberto, o Beto, o promotor ouviu como testemunha Inês Etienne Romeu, que, milagrosamente, sobreviveu à Casa da Morte e, depois, conseguiu localizar o imóvel. Ela declarou que ouviu dos militares que estavam lá que Beto desapareceu na Casa.

- Mandei um documento aos comandos militares pedindo informações e todos os documentos existentes sobre a Casa da Morte. Os comandantes militares entendem que ainda têm status de ministros e me informaram que eu não podia requisitar. Encaminhei o pedido à Procuradora Geral da Justiça Militar, que enviou o pedido. Eles responderam que não há informação - diz o procurador.

O promotor acha que há documentos dentro das Forças Armadas sobre esses fatos ou, pelo menos, informação sobre como foram destruídos.

- O militar destruir documento é crime. Quando um militar destrói um documento, ele tem que fazer um termo explicando a decisão.

Bravo foi a primeira autoridade a ouvir, após 40 anos, Eliana Paiva, uma das filhas de Rubens, que, aos 15 anos, foi presa, agredida e interrogada no DOI-Codi, no dia seguinte à prisão do pai.

Portanto, testemunha-chave.

- Nem no IPM de 1986 a Eliana foi ouvida. Isso é inacreditável - comenta o promotor.

Bravo lamenta que o Brasil tenha a “mácula” de ser o único país da América Latina que não investigou crimes do regime de exceção, mas diz estar confiante com a instalação da Comissão da Verdade. O promotor de 43 anos, filho e neto de militares, rejeita o argumento de que há dois lados a

serem investigados.

O programa “Espaço Aberto” sobre Rubens Paiva, exibido nesta quinta-feira na Globo News, será reapresentado nesta sexta-feira às 16h05m; sábado às 0h30m e domingo às 19h05m.

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