Intervenção na Síria divide políticos franceses e é desaprovada pela opinião pública

Kênya Zanatta - RFI

Os Estados Unidos, a Inglaterra e a França discutem os detalhes de uma eventual intervenção militar conjunta na Síria, em resposta ao uso de armas químicas contra civis. Nesta terça-feira, o presidente francês, François Hollande, afirmou que seu país irá aumentar a ajuda enviada aos rebeldes. Mas esse engajamento militar francês na Síria não é unanimidade na classe política e na opinião pública. Neste programa conversamos com o especialista Fabrice Balanche para entender melhor a posição francesa em relação ao conflito na Síria.

"O massacre químico de Damasco não pode ficar sem resposta. E a França está pronta para punir aqueles que tomaram a decisão infame de usar gás tóxico contra inocentes", disse o presidente francês, François Hollande, em um discurso nesta terça-feira. Ele indicou assim claramente que a França participará de uma eventual intervenção militar coordenada por seus aliados americanos e britânicos, que ainda tentam obter o aval da ONU.

Especialista na Síria, o geógrafo Fabrice Balanche, professor da Universidade de Lyon, acredita que não haverá consenso na ONU em relação a essa intervenção, porque a Rússia e a China continuarão a usar seu poder de veto.

"Desde o início a França esteve na primeira linha contra o regime de Bashar al-Assad. Hoje uma intervenção militar está sendo preparada, oficialmente para proteger os civis, mas todo mundo sabe que é para derrubar o regime. E a França é obrigada a participar da intervenção, senão ela daria uma prova de fraqueza e falta de solidariedade em relação a seus dois aliados, Estados Unidos e Grã-Bretanha, além de trair a Otan e desmerecer seu assento permanente no Conselho de Segurança da ONU", diz ele.

O especialista explica que a posição francesa em relação ao conflito na Síria é totalmente diferente daquela que o país assumiu em 2003, quando os Estados Unidos invadiram o Iraque. Na época a França era totalmente contrária a essa intervenção militar, considerada "imperialista". Mas o contexto geopolítico era diferente, lembra Balanche. O regime de Saddam Hussein estava realmente isolado, o que não é o caso do regime de Bashar al-Assad na Síria, que conta com o apoio do poderoso eixo Rússia-China e do Irã.

Opinião pública

Apesar da determinação do governo socialista e do apoio da maior parte da classe política, o professor Fabrice Balanche explica que algumas vozes são tradicionalmente contrárias a esse tipo de intervenção militar: a extrema-esquerda, em nome do pacifismo e do anti-imperialismo, e a extrema-direita, em um reflexo isolacionista e por medo de favorecer a ascensão do islamismo.

"Mas há também vozes dentro da UMP, o maior partido de oposição, que denunciam a intervenção militar. Alguns políticos de direita fazem uma análise diferente daquela que é feita pela maioria da classe política e pelo governo. Eles dizem que se trata de uma guerra civil, e consequentemente não podemos intervir", explica ele.

Ao contrário do engajamento militar francês na Líbia, em março de 2011, e no Mali, em janeiro deste ano, que inicialmente eram apoiados pela maior parte da opinião pública, a intervenção militar na Síria não é unanimidade entre os franceses.

Uma pesquisa de opinião realizada em julho indicou que 60 % dos entrevistados não aprovava uma intervenção internacional. A tendência talvez mude depois da divulgação das imagens chocantes das vítimas do ataque químico na periferia de Damasco. Mas essa desaprovação reflete a evolução da opinião pública francesa sobre os conflitos no Oriente Médio, segundo o especialista Fabrice Balanche.

"Passado o entusiamo do início da Primavera Árabe, a opinião pública se deu conta de que o que está acontecendo no mundo árabe, e sobretudo na Síria, é muito mais complicado do que imaginávamos. Não é somente um povo contra um regime. É uma guerra civil com um regime que é apoiado por parte da população", diz ele.

"Por uma ironia do destino, os partidários do regime sírio são aqueles que aderiram mais aos valores e ao estilo de vida ocidentais: cristãos, laicos, alauítas e alguns grupos sunitas. E aqueles que nós vamos apoiar são pessoas que chamamos de islamitas moderados, mas que na prática não são nada moderados. E essa intervenção pode favorecer os extremistas, que se aproveitarão do enfraquecimento do regime de Assad para tomar o poder e perseguir ou eliminar aqueles que resistem a eles, ou seja, cristãos, alauítas e outras minorias", acrescenta.



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