Olga, uma combatente das milícias: “Não sabia que iria odiar tanto a bandeira ucraniana”

Ao olhar para a frágil moça de dezenove anos de nome Olga, da cidade ucraniana de Gorlovka, não podemos adivinhar que ela já é uma combatente experimentada das milícias. A guerra civil no leste da Ucrânia arruinou-lhe a juventude, mas Olga não parece infeliz, apesar de reconhecer que tem muita vontade que chegue a paz.


Voz da Rússia

Recordando os motivos que a trouxeram para as milícias da não-reconhecida República Popular de Donetsk, Olga explicou que a “última gota” para ela foi a tragédia de 2 de maio em Odessa. Olga se juntou às milícias, tendo mesmo para isso se separado de seu noivo:

“A última gota para mim foi Odessa, quando começaram queimando pessoas vivas. Eles gritavam no Maidan: nós vamos matar todo o Sudeste. Até me arrepiei”.


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Sede da Euromaidan queimada em Kiev, Ucrânia | Reprodução


Nessa altura Olga tinha um passatempo específico: tiro ao alvo. Isso foi suficiente para ela pegar em armas. “Mas eu ainda não sabia o que era um ferrolho, tampa, cilindro de gases, calibres. Tudo isso veio com a experiência”, reconhece.

Ainda há poucos meses Olga vivia na sua cidade natal de Artemovsk, vizinha de Gorlovka, e estudava num colégio para professora de música. Ganhava algum dinheiro, primeiro como garçonete, depois numa fábrica de processamento de carne, depois como assistente de loja.

Depois à Bacia do Don chegaram aqueles que aqui são considerados como ocupantes e inimigos. Ela se juntou às milícias “para defender nossas terras, a minha casa”. Por causa disso ela acabou mesmo com o noivo, que tentava convencê-la que esta não era uma guerra deles e que era melhor esperar do lado de fora. A moça recorda:

“Eles dizem que não tocam nos civis, mas eu vi com meus próprios olhos ordenhadoras que foram torturadas, lhes cortaram a pele entre os dedos. Eu não sei o queriam saber dessas mulheres simples, talvez quem se tenha juntado às milícias. Eu vi como em Slaviansk trouxeram para o hospital dois corpos de milicianos decapitados. Eles nem podem ser reconhecidos para que as mães sejam notificadas de sua morte.

“Recordo-me que estivemos em Semenovka, lá tivemos uma visão horrível quando estás dentro de um veículo e não podes fazer nada porque estão bombardeando. Não vais correr com um fuzil contra projéteis de artilharia. E vês correrem contra ti os rapazes que estavam nas posições e têm as roupas ardendo, nem a água, nem a terra os salva. O fósforo queima tudo”.

Primeiro Olga esteve em Artemosvsk na milícia voluntária. Depois ela foi transferida para as escoltas para Slavyansk - acompanhar caminhões-tanque com gasolina, que transportavam gasolina para Slavyansk, transportavam alimentos, reabastecimentos:

“Quando circulas em Semenovka tens a trava de segurança desativada, a munição na câmara e o dedo no gatilho, e não sabes o que te pode atingir. É um medo horrível. Uma vez, quando seguíamos, rebentou um projétil mesmo a 20 metros. Aceleramos logo para 190 quilômetros por hora”.

Pouco depois ela teve de abandonar sua casa:

“Eu acompanhava um ônibus com refugiados para a Rússia. Na fronteira telefonaram-me, mesmo junto à faixa de separação. Lembro-me bem desse momento. Os meus amigos disseram-me que Artiomovsk foi tomada e que não poderei regressar. Foi assim que eu acabei em Gorlovka e aqui fiquei”.

Olga é responsável pela disciplina no seu destacamento. Três dos seus amigos de Artemovsk, com quem ela se juntou às milícias, já não estão vivos, morreram nos combates. “A minha mãe derrama lágrimas: o que vai ser se te matarem? Eu respondo-lhe: nós sabíamos ao que íamos”, diz a moça.

“Eu tenho um sentimento novo. Não é tanto a defesa da terra. É simplesmente um sentimento de vingança, talvez, um ódio terrível. Nós aqui já vimos de tudo: aqui em Gorlovka uma mãe com um bebé foram despedaçados. Umas velhotas que estavam sentadas num banco, roendo sementes, também foram despedaçadas. Dispararam mísseis contra a fábrica Stirol. Nós já nem reparamos nos mísseis, só nos indignamos quando eles disparam de noite e não nos deixam dormir”.

“Agora para mim o conceito de Ucrânia já não existe", reconhece. “Eu não sabia que iria odiar tanto a bandeira ucraniana”. Olga reconhece que já tem dificuldade em imaginar uma vida de paz:

“Recentemente fomos visitar um miliciano local, descansar um pouco, ver um filme. Era tão estranho ver as cortinas, um divã macio. Já há dois meses que não vou a casa. Nem sei como me vou adaptar depois de tudo isto. Em casa talvez venha a ter uma tenda”.

No dia 30 de setembro Olga cumprirá vinte anos de vida.


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