Investimentos chineses podem substituir empreiteiras na área de Defesa

Roberto Lopes
Editor de Opinião da Revista Forças de Defesa

Após passar os últimos quatro meses assistindo a busca ansiosa dos militares argentinos pelo apoio financeiro da China à renovação dos seus meios de patrulha naval, da sua aviação de caça e do seu parque de blindados sobre rodas, os militares brasileiros começam a perceber que a silhueta do gigante chinês se desenha com nitidez crescente também no horizonte de Brasília.


Li Keqiang

E que o diligente governo de Pequim parece ter feito a leitura correta da janela de oportunidades que vem se abrindo no Brasil, desde que as investigações da Operação Lava Jato criminalizaram boa parte das atividades das principais empreiteiras nacionais.

Some-se a isso o fato de o caixa do governo federal estar prestes a ser esvaziado de 60 bilhões de Reais – a conta provável do “ajuste fiscal” –, e fica fácil concluir o tamanho da chance que os chineses têm, de fazer sucesso no Brasil – inclusive na área da Defesa Nacional.

Tal perspectiva não deriva de análises ou percepções recentes.

Comitê 


Circunstâncias favoráveis à aproximação Brasil-China no campo militar existem desde que, em 2010, os dois países estabeleceram um Comitê Conjunto de Defesa Brasil-China – mais tarde redenominado Comissão Conjunta de Intercâmbio e Cooperação dos Ministérios da Defesa da China e do Brasil.

O 4º Encontro dessa Comissão aconteceu na primeira quinzena do mês passado, em Brasília, sob o manto de discrição que é um dos dogmas da política chinesa de penetração estratégica.

Conforme o ForTe – Forças Terrestres - informou com exclusividade, à testa da delegação do Exército de Libertação Popular da China (leia-se Forças Armadas chinesas), estava ninguém menos que o almirante de quatro estrelas Sun Jianguo, de 63 anos, principal negociador internacional dos militares chineses.

O problema é que bem pouca gente, entre os formadores de opinião e a imprensa tida como “especializada” em assuntos militares, dá importância às investidas dos chineses no campo da Defesa, no Brasil.

Prevalece a impressão de que, em face da nossa tradicional história de cooperação militar e industrial-militar com os Estados Unidos e a Europa (França, Alemanha, Inglaterra, Itália e agora Suécia e Turquia), os militares brasileiros jamais se afastarão de marcas ocidentais consagradas como General Dynamics, Boeing, TKMS, Thales e tantas outras.

Embranav 

Essa percepção da realidade existiu, realmente, mas vem mudando.

E com o enfraquecimento do poderio das grandes empreiteiras nacionais, vem mudando muito mais rapidamente.

Nos últimos dez meses recebemos as visitas do presidente da China, Xi Jinping, e de seu ministro da Ciência, Tecnologia e Indústria de Defesa, Xu Dazhe – em julho de 2014. Em janeiro passado o vice-presidente chinês Li Yuanchao também apareceu em Brasília; em abril foi a vez do almirante Jianguo e nesta terça-feira fará sua aparição o Primeiro-Ministro Li Keqiang, que trará na pasta um pacote de 53,3 bilhões de dólares para ser investido a curto, médio e longo prazos no país – aproximadamente 20% de tudo o que os chineses pretendem investir na América do Sul.

Como forma de dar consequência à sua passagem por Brasília, Li Keqiang deve anunciar um financiamento para que a empresa de aviação regional Tianjin Airlines compre 22 aeronaves da Embraer. A companhia é uma das empresas-símbolo da tecnologia nacional – verdadeiro orgulho dos brasileiros – e tem sofrido com a inadimplência do governo federal nos contratos de fornecimento de aeronaves e serviços militares – tanto que já pensa em desaquecer suas atividades da linha de Defesa.

A Marinha do Brasil sonhou, tempos atrás, em fazer da empresa Odebrecht Defesa e Tecnologia (ODT), sua parceira no Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB), uma Embraer do mar – a Embranav, conforme gostavam de chamar alguns chefes navais –, mas a direção da empreiteira preferiu não enfrentar esse Mar Tenebroso, e dar máquinas à ré…

Prioridades 

Espaço para cooperação é, portanto, o que não falta.

No ministério chefiado pelo petista Jaques Wagner há espaço para colaboração 

(1) no desenvolvimento do projeto do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas – SGDCE – (para quem não sabe, a grande prioridade dos militares que servem no Ministério da Defesa); 

(2) na implantação do Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAZ); 

(3) no estabelecimento de uma capacitação verde-amarela em cyberdefesa; 

(4) no provimento das obras e dos equipamentos que se fazem necessários ao projeto PROTEGER; 

(5) na alavancagem dos financiamentos indispensáveis à viabilização do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON), e em mais de 20 outros programas prioritários das Forças Armadas que, em seu conjunto – por força do sucateamento das Forças Armadas brasileiras entre as décadas de 1970 e 2000 –, vão requerer um somatório bilionário de verbas.

Os chineses, sabe-se, têm uma fixação por investimentos em infraestrutura.

Na passagem de Keqiang por Brasília devem ser assinados 36 diferentes acordos, incluindo o que cria a linha de crédito para o financiamento da ferrovia transoceânica, ligando a linha brasileira Norte-Sul ao oceano Pacífico, passando pelo Peru – tudo isso é do interesse das Forças Armadas.

Mas há outras áreas que os chineses consideram preferenciais: autopeças, equipamentos de transporte, energia, ferrovias, portos, estradas, aeroportos, estruturas de armazenamento, siderurgia – e tudo o que possa facilitar o escoamento da produção de matérias-primas de seu interesse.

O roteiro do giro do Primeiro-Ministro Li Keqiang pela América do Sul, a partir desta semana, dá bem ideia da preferencia que Pequim confere às nações sul-americanas: Brasil, Chile, Colômbia e Peru.

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