A reconstrução da frota de escoltas da Marinha do Brasil

Recuperação da capacidade de combate será difícil se for feita somente à base de navios novos


Por Roberto Lopes | Poder Naval

Nos últimos 20 anos – e, em especial, na metade final dos anos de 1990 –, cinco diferentes prioridades passaram à frente da necessidade de modernização da frota de escoltas da Marinha do Brasil (MB).

Escoltas da Marinha do Brasil em manobras táticas
Escoltas da Marinha do Brasil em manobras táticas

Os chefes navais julgaram mais importante providenciar (1) a renovação da Força de Submarinos da Esquadra por meio da inovadora classe francesa (Scorpène), (2) o desenvolvimento da planta de propulsão nuclear do Álvaro Alberto, primeiro submarino com esse tipo de propulsão na MB, (3) a construção de um complexo naval militar único no Atlântico Sul (por suas dimensões e recursos tecnológicos)localizado em Itaguaí-RJ, (4) a reforma do porta-aviões São Paulo de forma a que ele pudesse ser mantido em atividade até a década de 2030, e (5) a aquisição dos meios aéreos de apoio que o São Paulo iria requerer,

Enquanto eram implementados, tais projetos acabaram absorvendo os recursos que poderiam ser aplicados em algumas compras de oportunidade. Aquisições que poderiam ter evitado (ou, ao menos, retardado) o grave conjunto de restrições operacionais que domina, hoje, os dois esquadrões de escoltas da MB – tanto na propulsão, quanto na obsolescência de sensores e dos sistemas de armas.

Perdas de oportunidade 

Nesse caudal de chances que passou pelo Almirantado brasileiro foram-se, por exemplo, as fragatas Type 22 Batch 3 da Marinha Real Britânica – batizadas Cornwall, Cumberland, Campbeltown e Chatham. Navios de 5.300 toneladas construídos na metade final dos anos de 1980, e cujo projeto incorporava as lições aprendidas pelos britânicos na Guerra das Malvinas em relação a design, à otimização do armamento, e às demandas por mísseis e peças de artilharia mais eficazes (como a substituição do míssil mar-mar francês Exocet pelo americano Harpoon, e a adoção de um canhão de proa de 114 mm, o que capacitava essas embarcações a realizar missões de apoio de fogo naval).

Nesse rio de oportunidades perdidas ficaram para trás também as oito fragatas leves das classes M e L, disponibilizadas pela Marinha da Holanda.

Os dois navios L, classe “Jacob van Heemskerck”, produzidos na mesma época que as Tipo 22 do lote 3, nunca chegaram a entusiasmar a MB, em razão do projeto (muito criticado no âmbito da própria Organização do Tratado do Atlântico Norte) que suprimira o convoo à ré – e, consequentemente, o hangar para helicóptero –, para permitir a instalação de um lançador de mísseis Mk.13, para mísseis antiaéreos Standard SM-1 de defesa de área.

Trinta anos atrás, os militares brasileiros davam preferência não às fragatas “dedicadas”, como o modelo van Heemskerck, de Defesa Antiaérea, e sim aos escoltas multifunção.

O PROSUPER (Programa de Obtenção de Meios de Superfície) e suas “fragatonas” de 6.000 toneladas poderia colaborar para mudar essa situação na Força Naval brasileira, mas esse plano foi congelado, e o que restou aos oficiais defensores de navios “dedicados” foi só um resfriado mesmo…

Chile 

As sete fragatas de emprego geral classe Karel Doorman também foram desprezadas pela MB, e acabaram encaminhadas às Marinhas da Bélgica, do Chile e de Portugal.

Entre o fim da década de 1990 e o início dos anos de 2000, os almirantes chilenos definiram uma política de renovação de meios para a sua Esquadra: unidades de construção em seu território (nas instalações dos Astilleros y Maestranzas de la Armada) somente as de patrulha oceânica do tipo Fässmer, de 1.800 toneladas de deslocamento e projeto alemão. O resto da Esquadra de alto mar chilena seria formado por meio das chamadas “compras de oportunidade”.

Na Marinha do Brasil o assunto divide opiniões.

Muitos oficiais lembram que a realidade da Força é essa, de manter suas flotilhas de escoltas à base de compras de navios usados. E argumentam que o estratagema terá que ser usado por muito tempo ainda, porque a alternativa de construir fragatas e destróieres em estaleiros nacionais é caríssima, e demandaria a existência de uma Política de Defesa de longo prazo, prestigiada tanto pelo Executivo, como pelo Legislativo.

Mas há, também, na Marinha, diversos oficiais que não gostam dessas aquisições de escoltas “de ocasião”, por conta de um convencimento: o de que esses navios não devem resultar de projetos concebidos sob requisitos de outras marinhas, ou seja, estranhos à Doutrina Naval Brasileira.

Para essas vozes, os escoltas precisam ser barcos que, em suas características básicas (de propulsão, estabilidade, habitabilidade e capacidade de sobrevivência) se encaixem, à perfeição, nas demandas delineadas pelo Estado-Maior da Armada e pelo Comando de Operações Navais.

O Chile é um exemplo a ser seguido?

Talvez não.

Cada marinha tem a sua rotina funcional e, sobretudo, os seus próprios requisitos operacionais.

Um país de dimensões continentais como o Brasil, possuidor de dezenas de estaleiros de bom porte (ou, no mínimo, bom potencial), como o Brasil, tem o dever de – exibindo postura responsável – habilitar ao menos alguns desses parques industriais às suas necessidades de Defesa.

Lista 

A questão agora é saber como os almirantes brasileiros vão se comportar diante das classes de escoltas que serão disponibilizadas nos próximos cinco ou seis anos.

O Poder Naval relacionou para os seus leitores cinco classes de navios de escolta que, no decorrer dos anos de 2020, serão desmobilizados em seus países de origem:

Duke Tipo 23 britânica – Fragatas de 133 m de comprimento e quase 5.000 (4.900) toneladas de deslocamento à plena carga, em uso desde 1991. A Armada chilena opera três dessas embarcações. As 13 restantes vêm recebendo sucessivas atualizações em seu armamento, e só começarão a dar baixa em 2023, mas essa é uma informação que ainda carece de confirmação pela Marinha Real Britânica.

HMS Lancaster, Type 23

Halifax canadense – Fragatas de patrulha multi-missão. De bom porte (134,1 m de comprimento e 4.770 toneladas de deslocamento), foram fabricadas entre o fim dos anos de 1980 e o início da década de 1990. Têm capacidade de transportar um helicóptero pesado. Estão na mira das Marinhas do Brasil e do Chile.

HMCS Regina (FFH 334), classe Halifax
HMCS Regina (FFH 334), classe Halifax

A modernização dessa classe foi completada em abril de 2016, e não se espera que, em razão das atuais dificuldades da Esquadra do Canadá, suas unidades estejam disponíveis para outras forças navais antes da segunda metade dos anos de 2020.

Meko 200 australianas – Menores (109 m de comprimento de casco) e mais leves (3.600 toneladas a plena carga) que as Halifax, mas também mais modernas que as unidades canadenses. Foram submetidas a um amplo e bem avaliado programa de modernização dos seus sensores e sistemas de armas. Apesar de serem considerados meios muito bons na atualidade, há dúvidas sobre o interesse da indústria alemã em garantir-lhes manutenção no futuro.

HMAS Warramunga (FFH 152)
HMAS Warramunga (FFH 152), classe Anzac, baseada na Meko 200PN de Portugal

A expectativa é de que comecem a ser disponibilizadas para outras marinhas a partir de 2024.

Tipo 123 alemã – A famosa classe Brandenburg, de 138,85 m de comprimento de casco e 4.490 toneladas de deslocamento (carregada), foi construída entre 1992 e 1995. Seus quatro navios têm entre 22 e 24 anos de uso, e vêm sendo modernizados. A previsão é de sejam desmobilizados somente a partir do fim da próxima década.

Brandenburg
F-218 Brandenburg

Murasame japonesa – Navios classificados como destróieres, de 151 m de comprimento e 6.100 toneladas (carregados), quase todos batizados com os nomes de destróieres japoneses da época da 2ª Guerra Mundial. Foram construídos entre os anos de 1993 e 2000. Na chamada Força de Autodefesa Marítima do Japão ganharam, durante sucessivas reformas, eletrônica de última geração e avançados sistemas de mísseis. Os primeiros devem ser retirados do serviço ativo no final da próxima década.

JS Murasame DD-101

Um aspecto comum a todas essas classes de navios é a ausência de um projeto – nas décadas de 1980 e 1990 – preocupado, na origem, com a furtividade.

Apenas a classe Murasame recebeu adaptações de stealth technology, como forma a reduzir a sua assinatura nos radares de potenciais inimigos.

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