Que consequências o combate ao crime organizado pode ter para as Forças Armadas?

Com o fim do governo de Michel Temer e a preparação para a posse do presidente eleito, Jair Bolsonaro, volta à tona a pergunta sobre o papel que deverão desempenhar as Forças Armadas daqui para frente. Elas ficarão restritas ao serviço de defesa nacional ou continuarão sendo utilizadas na segurança pública?


Sputnik

Em entrevista à Sputnik Brasil na última semana, o jornalista e especialista em Defesa e Relações Internacionais Pedro Paulo Rezende afirmou que essa prática de utilização do exército no combate ao crime organizado foi defendida pelos Estados Unidos como um papel importante das forças latino-americanas, contaminando todo o continente. Segundo ele, essa linha de atuação tem sido motivo de discórdia hoje no meio militar brasileiro, com alguns adeptos e outros contrários ao uso das Forças Armadas em missões que, originalmente, seriam da polícia. 


Exército faz operação na favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, zona norte do Rio de Janeiro.
Operação do Exército Brasileiro no Rio de Janeiro © Foto : Tomaz Silva/Agência Brasil

Para o cientista político e analista criminal Guaracy Mingardi, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, não há dúvidas de que a ideia básica é a de que tem que controlar a criminalidade são a polícia e a justiça. De acordo com ele, as Forças Armadas só devem entrar em última instância e por um período bem curto.

"Nós já temos várias experiências no mundo em que isso não deu certo. O caso do México é exemplar. O México colocou as Forças Armadas por alguns anos para controle do narcotráfico, a corrupção, que já era bem grande, aumentou muito. E tanto que um dos principais grupos, um dos principais cartéis, o Zetas, eles foram formados inicialmente só por militares oriundos dos grupamentos especiais, das forças especiais do Exército Mexicano", disse o analista à Sputnik Brasil.

O caso do Brasil, onde os militares vêm sendo utilizados para controle de traficantes em área urbana, é pior ainda, segundo Migardi. Ele destaca que, desde os anos 1990, já foram cinco ou seis intervenções só no Rio de Janeiro, sem levar a nenhuma mudança efetiva na dinâmica da criminalidade e ainda abrindo espaço para corrupção, devido a ligações que vão se criando entre criminosos e militares.

"Muitos oficiais do Exército são contra isso. E são contra com razão. Porque isso aí não é função deles, eles não têm know-how para isso", afirmou.

Mesmo no caso das operações contra o narcotráfico nas fronteiras, Mingardi acredita que as Forças Armadas não devem ser protagonistas, mas ajudantes de grande importância:

"Na prática, o que nós necessitamos no Brasil é de uma polícia de fronteira. Nós não temos. É a Polícia Federal que faz essa função também, entre várias outras. Mas nós não temos uma polícia de fronteira. Enquanto não temos, o Exército pode ajudar bastante nessa função. Mas não sendo o principal ator, como ator subsidiário. Porque o trabalho é policial."


Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem