O futuro dos Falcões

10 anos depois de sua criação, o 1º Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque da Marinha luta contra o baixo orçamento e dificuldades técnicas, mas ainda há luz no fim do túnel

Alexandre Galante

Limitada por um decreto governamental desde 1965, a Marinha do Brasil só podia operar helicópteros a bordo do seu porta-aviões. Os aviões embarcados P-16 Tracker pertenciam à FAB. Mas em abril de 1998, o presidente Fernando Henrique Cardoso deu permissão à Marinha para novamente operar aeronaves de asa-fixa e, três meses depois, foram comprados por US$ 70 milhões, 23 caças-bombardeiros A-4KU Skyhawk do Kuwait, incluindo peças de reposição e 217 mísseis ar-ar Sidewinder AIM-9H.

Na Marinha do Brasil os aviões receberam as designações AF-1 (monoplace) e AF-1A (biplace) e foram alocados ao recém-criado 1º Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque (VF-1).

A compra dos jatos Skyhawk e a posterior aquisição do navio-aeródromo francês Foch (rebatizado São Paulo) em setembro do ano 2000, deram à Marinha a chance de recuperar o tempo perdido na formação da doutrina da aviação de asa-fixa embarcada.

A Esquadra brasileira sempre se ressentiu da falta de apoio aéreo às operações navais afastadas do litoral e a posse de um navio-aeródromo de maior porte dotado de aviões de ataque com alguma capacidade de interceptação, elevou a Marinha do Brasil a um novo patamar operacional.

10 anos depois...

... a situação não é tão animadora quanto no início. Atualmente nenhum AF-1 Skyhawk está em condições de vôo por falta de motores e o navio-aeródromo São Paulo ainda deve demorar a voltar ao mar, devido a um problema num de seus eixos propulsores.

Há muito tempo a Marinha vinha mantendo apenas dois aviões em condições de vôo, um AF-1 e um AF-1A, por falta de recursos.

Em maio de 2005 foi selecionada a Lockheed Martin da Argentina para o serviço de apoio de seis jatos A-4 (AF-1) e para 10 turbinas J52-P408. O contrato para um período de quatro anos foi avaliado em US$ 6,5 milhões. Embora o trabalho da Lockheed tenha sido elogiado em alguns pontos, até agora nenhum motor enviado à Argentina foi devolvido revisado. Por causa desse atraso, a Marinha do Brasil teve de procurar um novo fornecedor para o serviço das turbinas e parece que a empresa IAI israelense foi a escolhida. Estima-se que os AF-1 só voltarão a voar no segundo semestre de 2008. Enquanto isso, os pilotos do Esquadrão VF-1 estão voando no simulador do Skyhawk instalado em São Pedro de Aldeia e nos aviões AT-26 Xavante da FAB, em Natal.

Com o esperado retorno do NAe São Paulo às operações normais e a chegada dos motores revisados dos AF-1, imagina-se que os pilotos navais brasileiros possam finalmente voltar a pousar e decolar do nosso porta-aviões ainda em 2008.

Uma performance histórica

O A-4 Skyhawk dispensa apresentações. Uma busca no Google traz 45.600 referências sobre a aeronave. Mas nunca é demais relembrar que o A-4 é um dos melhores e mais simples projetos de aviões de ataque de todos os tempos, tendo deixado sua marca registrada nas guerras do Vietnam, Yom Kippur e Malvinas. Neste último conflito no Atlântico Sul, em 1982, os Skyhawk argentinos afundaram com bombas "burras" o destróier Type 42 HMS Conventry e as fragatas Type 21 HMS Antelope e Ardent, bem como causaram pesadas avarias em vários outros navios. Mesmo em cenários atuais, como foi provado em exercícios, os Skyhawk ainda podem causar sérios problemas para navios de superfície modernos, pois seu pequeno tamanho e alta velocidade rente ao mar, o fazem um alvo difícil de ver, de detectar e derrubar.

Pela sua manobrabilidade, na arena ar-ar o A-4 também foi considerado um adversário de respeito, haja vista que o modelo foi usado como agressor durante muito tempo na escola Top Gun da US Navy. Vale lembrar que nossos AF-1 são da versão Skyhawk II, cujo motor tem quase 20% de potência a mais que as versões anteriores. Isso dá a eles uma performance muito melhor em combate aéreo aproximado.

Os Skyhawk brasileiros só não podem render mais por causa da sua aviônica analógica e pela falta de armamento ar-ar no "estado-da-arte".

Vale a pena modernizar?

Os Skyhawks da MB pertencem ao último lote fabricado pela McDonnell Douglas, tendo sido entregues ao Kuwait entre 1977 e 78. Como comparação, os F-5E da FAB que estão sendo atualmente modernizados, começaram a ser recebidos em 1976.

Apesar de serem veteranos da primeira Guerra do Golfo, quando foram comprados pelo Brasil os A-4KU tinham apenas 1.600 horas de vôo, e ainda encontram-se em excelente estado, segundo uma vistoria técnica recente. Levando-se em conta esse fatores, a MB planeja usar os aviões até 2020/25, que é também o limite da vida útil projetada do NAe São Paulo.

Sendo assim, foi instituído um Grupo de Trabalho, para estudar a revitalização e modernização dos AF-1 Skyhawk. O estudo prevê que a modernização seja conduzida no Brasil e usando o máximo possível de componentes do programa F-5BR e A-1M, levado a cabo pela Embraer e a Elbit israelense.

A revitalização, numa primeira etapa, compreenderá a substituição dos componentes mais envelhecidos e sujeitos a panes, que reduzem a disponibilidade dos aviões, como o sistema de navegação e rádio. Uma segunda opção de modernização abrangerá também a instalação de um glass cockpit, similar ao do F-5EM e do A-29 Super Tucano da FAB. E um terceiro pacote, incluirá um radar multimodo.

A abrangência do pacote de revitalização/modernização vai depender obviamente da disponibilidade de recursos. Acredita-se que o pacote mais completo custará em torno de US$ 66 milhões por 12 aviões modernizados, o que é praticamente o valor de apenas uma unidade do novo caça do Programa FX-2, que em breve deve ser escolhido pela FAB.

Se levarmos em conta que os Falcões após a modernização terão sua capacidade de combate multiplicada, similar à alcançada pelos F-5EM e A-1M (AMX) da FAB, a relação custo/benefício será bastante satisfatória para a Marinha.

Entre os radares que poderiam ser instalados no Skyhawk está o multimodo Mectron SCP-01 Scipio, feito no Brasil em conjunto com a Itália, e que será instalado nos AMX da FAB. É um radar otimizado para funções ar-superfície com alguns modos simples ar-ar. O radar tem a função de auxiliar o piloto a fazer operações de ataque ao solo e combate aéreo. Foi projetado para ser instalado a bordo do AMX e ser o principal sensor do subsistema de armas. O Scipio também poderia ser adaptado aos Skyhawk da MB.

O radar pode mapear o terreno, indicar alvos móveis terrestres, evitar o terreno, fazer telemetria ar-solo e ar-ar, busca marítima e tem capacidade look down/look up (olhar para cima e para baixo).

Operando na banda X, com agilidade de frequência, o radar é capaz de identificar um alvo de 100 metros quadrados no mar a 50 milhas e tem alcance de 20 milhas contra um alvo aéreo de 5 metros quadrados.

É bom lembrar que o principal avião de combate argentino atual é o Skyhawk versão A-4M, que foi modernizado nos EUA, e emprega um radar APG-66 modificado.

Armamento ousado

Hoje qualquer treinador turboélice ou à jato pode tornar-se um adversário ar-ar perigoso para caças legítimos, graças aos avanços de mísseis como o Python 5, que pode ser disparado contra alvos fora do eixo longitudinal do avião, com o buscador do míssil "amarrado" à mira do capacete do piloto. Graças à miniaturização da eletrônica, até um míssil BVR como o israelense Derby pode ser levado pelo Skyhawk, pois seu tamanho é pouco maior que um Sidewinder. O Derby já é usado pela FAB no F-5EM.

Da mesma forma, na arena ar-superfície existem armas stand-off que permitem o ataque a alvos bem defendidos no mar e na terra. Um ótimo candidato para o AF-1 modernizado seria o míssil Popeye 2 (ou Have Lite), da Lockheed e Rafael, já homologado para o Skyhawk, guiado por TV e IR, com alcance de mais de 50 milhas náuticas.

O míssil Popeye 2 é o sonho de qualquer aviador naval, pois permite o engajamento de alvos bem fora do alcance de mísseis superfície-ar, arriscando o mínimo possível a vida dos pilotos contra alvos bem defendidos.

Bombas guiadas a laser (e por GPS) também poderão fazer parte do repertório dos AF-1 modernizados, de preferência adquirindo-se os kits Lizard já usados pela FAB.

Homologar o míssil antinavio AM39 Exocet (já usado pela Marinha nos seus helicópteros SH-3) para ser disparado do Skyhawk pode ter complicações que não compensem, sendo assim poderiam ser adquiridas algumas unidades do míssil Gabriel III já compatibilizado ao A-4.

Embora o custo do armamento moderno seja elevado, é possível a aquisição de pequenas quantidades para familiarização e treinamento, até que se tenha condições para formação de estoques de guerra.

O tempo é agora

A Marinha do Brasil soube ousar quando quis ter de volta o direito de possuir seus aviões de combate e também quando adquiriu o NAe São Paulo.

Se ela pretende que sua aviação embarcada tenha uma capacidade de combate crível no século XXI, será preciso ousar novamente. Até que novas aeronaves e um novo NAe possam ser adquiridos pelo Brasil, é necessário modernizar os Falcões e o porta-aviões São Paulo, tendo em vista a disparidade tecnológica desses meios em comparação com a tecnologia aeronaval atual e das próximas duas décadas. Mas é preciso agir logo, para que a janela de oportunidade não se perca, tendo em vista a idade dos equipamentos, que se aproximam cada vez mais do final de sua vida útil.

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