Oportunidade histórica



Brasil e França acabam de assinar convênio de livre trânsito de seus militares a fim de facilitar a realização de manobras e exercícios conjuntos. Não apenas isso: deu-se o primeiro passo concreto no estabelecimento de parceria estratégica. O acordo permitirá a aviões militares franceses entrarem em espaço aéreo do Brasil sem precisar de autorização prévia. Da mesma forma, aos aviões brasileiros será permitido o ingresso em espaço aéreo francês. A idéia é evitar a burocracia da aprovação de lei específica para tal fim a cada vez que se planejam operações como a Cruzeiro do Sul, que se realiza desde 1996 (a adição de 2006 foi em Anápolis-GO). Em abril, pilotos franceses treinarão no porta-aviões São Paulo, já que o porta-aviões nuclear francês Charles de Gaulle está em manutenção.

O trânsito de militares é apenas uma face do Acordo de Status das Forças (Sofa, da sigla em inglês), que compreende a isenção das exigências fiscais das aduanas e a proteção jurídica dos efetivos.

Nesse caso, militares de ambos os países, caso intimados civil ou criminalmente, só poderão ser processados na Justiça das respectivas pátrias, escapando assim à jurisdição do Tribunal Penal Internacional. O tratado, que precisará ser aprovado pelos parlamentos brasileiro e francês, deve permitir a prestação de serviços, condição básica para parcerias que compreendem a troca de tecnologia tão almejada pelo governo. Mas é preciso analisar essa parceria não só do ponto de vista do reaparelhamento e do desejo de desenvolvimento do parque industrial bélico, mas também pela perspectiva geoestratégica.

A França é o único país desenvolvido com o qual o Brasil tem fronteira comum, na Guiana Francesa. Uma parceria estratégica parece tão óbvia, que é difícil compreender décadas de negligência de ambos os países em aproveitar tamanho potencial. Os presidentes Lula e Nicolas Sarkozy corrigirão o erro histórico no dia 12 de fevereiro, ao colocarem a pedra fundamental da ponte que unirá o município de Oiapoque à cidade francesa de Saint-Georges. Trata-se de importante ato político. A França pode significar a porta de acesso à tecnologia de toda a União Européia (UE) em matéria de defesa, uma oportunidade de abandonarmos o imobilismo na garantia da soberania brasileira.

Em contrapartida, o Brasil estará impelido a construir um sistema de defesa articulado globalmente. A assinatura do Sofa abre a possibilidade de protocolos similares no ambiente sulamericano, e espaço para possível aliança de segurança regional. Não há como evitar tal movimento, pois disso dependem também a segurança energética e social do Brasil e da América do Sul nas próximas cinco décadas. A descoberta de novas fronteiras de recursos naturais, como gás e petróleo, promove a região na escala de interesse mundial. Ninguém quer que a América do Sul se transforme num Oriente Médio. Mas a atual ação política demanda fluxo financeiro para sustentá-la. Há alto preço a pagar e precisamos nos perguntar se estamos dispostos a aceitar tal custo ou mesmo preparados para as novas responsabilidades. Não há tempo a perder. Urge a reinvenção do pensamento de defesa no Brasil.

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