De olho nas bases

Senado brasileiro ouve embaixador colombiano sobre acordo militar com os Estados Unidos e aceita convite para visitar as bases que o país cederá para operação das tropas americanas

Silvio Queiroz – Correio Braziliense

A Comissão de Relações Exteriores do Senado prepara a visita à Colômbia de uma delegação, que possivelmente incluirá também deputados, para examinar de perto a cooperação militar entre o país vizinho e os Estados Unidos, objeto de preocupações expressas pelo governo brasileiro e outros da região desde que foi noticiado um acordo sobre a cessão de até sete bases colombianas para operação de tropas americanas. O convite foi feito — e prontamente aceito — pelo embaixador Tony Jozame, durante audiência informal em que ampliou as explicações dadas na última quinta-feira pelo presidente Álvaro Uribe, durante visita-relâmpago que incluiu uma longa reunião com o colega Luiz Inácio Lula da Silva e uma conversa de meia hora com um grupo de senadores, na base aérea.

Durante o debate, ficaram à mostra algumas diferenças pronunciadas de apreciação entre os congressistas sobre a polêmica das bases, que se tornou tema central da breve cúpula da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), realizada anteontem em Quito. Pelo lado dos democratas, os senadores Heráclito Fortes (PI) e Romeu Tuma (SP) manifestaram total “solidariedade” ao governo de Bogotá e minimizaram os receios pela presença militar americana às portas da Amazônia. Mas o vicepresidente da comissão, Geraldo Mesquita (PMDB-AC), fez coro com o Planalto e o Itamaraty, que consideram as explicações colombianas apenas “um bom começo”, enquanto Pedro Simon (PMDB-RS) apontou os americanos como o foco real de apreensão.

“Base americana, a gente sabe como começa, mas não como termina”, disse Simon depois de ter ouvido as colocações iniciais do representante colombiano. O parlamentar aplaudiu a proposta de Lula de que a Unasul leve suas preocupações sobre o acordo EUA-Colômbia ao presidente Barack Obama e reiterou suas críticas à reativação da 4ª Frota norte-americana, com jurisdição operacional na América Latina. “Com a vitória de Obama, está havendo um esvaziamento da Guerra Fria”, argumentou o senador, citando as iniciativas de desarmamento que o novo presidente dos EUA fechou com a Rússia e seu engajamento com a retomada do processo de paz no Oriente Médio. “E de repente esvazia lá e vem para cá, para a nossa América?”

Em sua exposição, o embaixador Jozame fez questão de frisar um dos argumentos centrais do governo colombiano, segundo o qual “não existirão bases americanas, mas bases colombianas” à qual os militares americanos terão “acesso operacional limitado” — termos nos quais o acordo é definido em um documento distribuído aos congressistas. O diplomata acrescentou alguns detalhes às informações já prestadas, em particular sobre a natureza do acordo em discussão com os EUA e sobre a dimensão do efetivo militar americano. Segundo o representante colombiano, o documento é “um convênio adicional” ao Plano Colômbia, tratado de cooperação (inclusive militar) firmado pelos dois países em 2000. Jozame garantiu que as atividades previstas são “as mesmas do Plano Colômbia”, que preveem capacitação e treinamento das tropas colombianas para o combate “ao narcotráfico e ao terrorismo”.

De acordo com o embaixador, o Plano Colômbia autoriza a presença no país de até 800 instrutores e 600 militares dos EUA, “mas hoje esse efetivo é de 400”. Com a extensão da cooperação às sete bases — que se espalham do litoral do Caribe, no norte, até as planícies do sudeste, a cerca de 400km da fronteira com Brasil e Venezuela —, o efetivo americano “chegará a menos de 50%” do teto previsto. Respondendo aos receios quanto a possíveis operações americanas em outros países a partir da Colômbia, Jozame foi categórico: “Entre os princípios (do acordo) está a não intervenção em assuntos internos de outros países”.

“Não me preocupo com esse acordo porque conheço as forças de segurança da Colômbia, do tempo em que fui diretor da Polícia Federal”, disse o senador Romeu Tuma. “Participei de várias reuniões e operações conjuntas e visitei inclusive estações de radares operadas pelos americanos em bases colombianas”, prosseguiu. “O que causa apreensão é a Venezuela comprando armas da Rússia.”

Tuma criticou “as pressões” do presidente venezuelano, Hugo Chávez — “foi ele quem falou em guerra” —, alvo indireto de ataque também de Heráclito Fortes, que elogiou Uribe pelas iniciativas contra o narcotráfico: “Se alguns não querem fazer, vamos deixar quem quer fazer”.

Relações íntimas

A cooperação militar entre Colômbia e Estados Unidos vem de meio século, mas incrementou-se desde o Plano Colômbia (2000) e mais ainda com George W. Bush na Casa Branca (2001-2009). Em 2007, o secretário americano de Defesa, Robert Gates (C), mantido por Barack Obama, reuniu-se na base colombiana de Tolemaida (uma das que serão cedidas pelo novo acordo) com o comandante das Forças Militares, general Freddy Padilla (E), e o então ministro da Defesa, Juan Manuel Santos, o favorito de Uribe para sucedê-lo em 2010.

CORRIDA ÀS ARMAS

Se alguns senadores temem que o acordo Colômbia-EUA provoque uma corrida armamentista na América do Sul, o anúncio feito ontem pela Bolívia confirma algumas preocupações. O vice-presidente Álvaro García afirmou que o país abrirá negociações com a Rússia e a China para adquirir helicópteros e armamentos destinados a reforçar a capacidade de patrulhamento das fronteiras, em especial no combate ao narcotráfico. Segundo García, a intenção inicial era comprar aparelhos checos e da empresa norte-americana Bell, mas a negociação teria sido vetada por Washington. O presidente boliviano, Evo Morales, rompeu a cooperação com os EUA na luta antidrogas.

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