Especialistas dizem que acordo é político e cobram mais debate

Para professor da UFSCar, compra de caças não é nem "luxo nem capricho"

Soraya Aggege - O Globo

SÃO PAULO. O mega-acordo militar entre Brasil e França, que inclui a compra de 36 aviões de combate franceses, foi uma decisão política de peso, tomada com pouco debate democrático. A avaliação é de especialistas consultados pelo GLOBO. Eles consideram, porém, que o acordo é positivo e que a escolha da França foi a melhor opção.

- A decisão foi acertada. Seria melhor se tivesse havido mais debates, inclusive para que as pessoas entendam que esse acordo não é um luxo nem um capricho militar. Não dá para o Brasil se projetar como potência global se não tem estrutura sequer para defender seu território. Principalmente agora, com a descoberta do pré-sal - avalia o professor Luís Alexandre Fuccille, do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp.

Fuccille foi gerente do Departamento de Política Estratégica do Ministério da Defesa (2003 a 2005). Lembra que a compra dos caças é adiada há dez anos:

- Oxalá não precisemos nos defender, pois nossa frota é muito antiga, de 1973. Há pouco tempo, das 700 aeronaves da FAB 350 estavam paradas por falta de peças de reposição.

Para Fuccille, o Brasil não poderia aceitar a oferta dos EUA por uma questão estratégica: o país veta atos soberanos sob o argumento de sua tecnologia:

- O Chile comprou caças dos EUA e os recebeu sem os mísseis. O Brasil foi impedido de vender os Tucanos à Venezuela porque usavam tecnologia americana. Não se contraria os interesses dessa potência.

O especialista diz que a proposta da Suécia também não poderia ser aceita: possui tecnologia americana e seus aparelhos têm pouca autonomia de vôo.

- Não defendo uma corrida bélica, e creio que a prioridade precisa ser o combate à pobreza. Mas se o Brasil quiser se projetar mundialmente, precisa inclusive deter o know how da energia nuclear. Os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (França, EUA, Reino Unido, China e Rússia) são nuclearizados. Índia e Paquistão reivindicam o assento. Ou o Brasil monta sua defesa, ou não será potência.

O professor da Universidade Federal de São Carlos João Roberto Martins Filho, vice-presidente do Comitê de Forças Armadas da Associação Internacional de Ciência Política, concorda que faltou transparência. Mas frisa que não faltaram consultas às Forças Armadas e que o processo está correto.

Ele foi presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa e um dos consultados no início do projeto do plano nacional de defesa, pelo ex-ministro Mangabeira Unger:

- Fui consultado, mas considero que não houve uma conversa mais ampla. Era de se esperar uma democratização maior da defesa, com o envolvimento de mais atores no debate. Mas no geral, ele está correto.

Segundo ele, o acordo é muito amplo, incluindo até a Embraer entrando num novo mercado, de venda de dez aviões KC-390:

- É sempre muito complicado para um país como o Brasil gastar tanto com sua defesa. Mas ela é fundamental, e já se gastava mais para "tapar buraco".

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