A escolha do avião supersônico


Luiz Marinho - Correio Braziliense

Entre 15 e 18 de março, chefiei, como prefeito de São Bernardo do Campo, delegação em visita à Suécia. Nossa cidade poderá acolher parte da produção do Gripen, avião de caça supersônico sueco.

Suécia, França e EUA estão na disputa pelo fornecimento dos aviões que servirão para a defesa do território do Brasil nas próximas décadas. A escolha é de competência do presidente da República, do Ministério da Defesa e das Forças Armadas, mas espero contribuir na tomada de decisão, passando minhas impressões sobre a proposta sueca.

O Gripen não tem nada de "avião de papel", como se especulou no Brasil. Tive oportunidade de voar e conhecer in loco o processo de produção. O que está no papel é o desenvolvimento de nova geração de aeronaves, e é isso que a Suécia quer compartilhar com a engenharia brasileira, militar e civil.

A imprensa divulga que os custos por ano de vida útil do Gripen são bem inferiores aos dos concorrentes. Isso é importante. Não podemos desperdiçar divisas. Mas o que determina a escolha vai além do preço. Somos um país pacífico e assim continuaremos. Nosso desafio é combinar nossa diplomacia com uma estratégia de defesa e soberania nacional, bem como com uma industrialização avançada. Nesse ponto, a proposta sueca mostra-se bastante interessante ao Brasil.

Metade da aeronave será produzida no Brasil e metade na Suécia. O Brasil produzirá até 80% da estrutura mecânica e 40% da engenharia de projetos. Os componentes aqui fabricados não poderão ser produzidos na Suécia e em nenhum lugar do mundo. Será uma dependência recíproca. A Força Aérea Brasileira e o setor privado nacional participarão desde os estágios iniciais do projeto. Empresas brasileiras – como a Embraer — produzirão a fuselagem traseira e central, as asas, os displays e o trem de pouso e as portas para as unidades produzidas no Brasil, na Suécia e no resto do mundo.

O desenvolvimento de equipamentos de guerra tem impacto muito além da área militar. Muitos dos projetos da aviação civil, passando pela área de infraestrutura, até utensílios domésticos derivam de tecnologias militares. No caso do Gripen, a transferência tecnológica é clara. A primeira etapa é a familiarização do produto e treinamento de pilotos, engenheiros e técnicos brasileiros por meio de intercâmbios programados com a Suécia. A segunda é o que se denomina de treinamento on-the-job, que é o aprender na prática. A assistência técnica no Brasil e os pacotes específicos de tarefas são outras fases da transferência.

A formação de um cluster aeroespacial e de defesa contribuirá fortemente para a transferência tecnológica. Visitamos o Parque Tecnológico da Universidade de Linköping. Ali, pesquisa básica e aplicada transforma-se em inovações e empreendedorismo de pequenas empresas, que, por sua vez, se inserem nos projetos do governo e da grande empresa.

Ao optar pela fabricação dessa aeronave no Brasil, serão necessários 2.090 empregos por ano na fase do desenvolvimento; 2.770 no processo de fabricação e 1.000 na montagem. São 5.860 empregos por ano. Número que pode ser multiplicado, quando se considera também o impacto indireto.

A maioria desses postos de trabalho terá elevada capacitação. Em função dos efeitos positivos do projeto, sindicalistas suecos deixaram claro o apoio à parceria com o Brasil. O que importa é a perspectiva de longo prazo.

Fomos recebidos pelo Ministério da Defesa, Ministério do Desenvolvimento, partidos políticos, universidades, prefeitos, empresários e sindicalistas. Fui convidado a uma audiência com o rei Carl Gustaf e a rainha Silvia. A deferência não representa benevolência com o Brasil. A Suécia é potência não alinhada e tem interesses em alcançar novos mercados de exportação. Os suecos veem o Brasil como potência em ascensão, com facilidade de penetração em mercados estratégicos. Para além dos US$ 4,5 bilhões envolvidos com a compra pelo Brasil de 36 supersônicos Gripen, o que está na mesa são valores bem superiores já que objetivo é a conquista de novos mercados internacionais.

O Brasil pode intensificar a negociação e melhorar a proposta. A decisão final caberá ao presidente da República. Mas é fundamental que toda a sociedade brasileira discuta os prós e os contras. Afinal, é o nosso voo rumo ao futuro que está em jogo.

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