Aviões de caça para a FAB

Emanuel Fernandes e Ozires Silva - Folha de SP

É com o objetivo de lançar luzes sobre a discussão que expomos uma alternativa para o atual processo de aquisição dos caças

A condução do processo de licitação para a compra de 36 aviões de combate para a FAB (Força Aérea Brasileira) vem se transformando em um dos principais equívocos do atual governo.
 
Ao anunciar antecipadamente a vitória de um dos três concorrentes em setembro último, o presidente Lula contaminou o processo de maneira quase irreversível.

Por outro lado, é inegável a necessidade do reequipamento das Forças Armadas brasileiras e a importância do tema, que permite passos significativos no processo de desenvolvimento da capacidade produtiva nacional, oportunidade esta que não deve ser perdida.

É com o objetivo de lançar luzes sobre essa discussão que expomos uma alternativa para o atual processo de aquisição dos caças.

Nos processos tradicionais, nas importações gerais de material militar, o governo tem aparecido como contratante direto do fornecedor estrangeiro selecionado pelos requisitos das Forças Armadas, colocando em execução o contrato de compra.

Procedendo assim, cresce o risco de se perderem aspectos importantes em quase todo o capítulo da chamada "transferência de tecnologia ou de conhecimento", pois é difícil se apropriar de experiências a partir da rigidez, da fiscalização e das características dos contratos governamentais.

Uma alternativa, eficaz e de resultados provados, poderia ser a metodologia seguida por muitas nações do mundo desenvolvido, em particular, consolidada pela legislação nos Estados Unidos, em vigor desde 1933.

Essa legislação, o Buy American Act, determina que toda e qualquer aquisição de material militar por parte do governo norte-americano necessariamente deve ser feita por meio de empresas nacionais, com cláusulas de participação da mão de obra e do conhecimento nacionais.

O processo é simples. A Força Armada, por meio de seus estudos técnicos, com a observância da estratégia da defesa nacional, determina o material de que necessita, modifica as especificações e requisitos técnicos e seleciona o fornecedor estrangeiro.

A proposta da Força é aprovada pelo governo e, ato contínuo, um fornecedor doméstico, empresa ou consórcios de empresas, reconhecidamente competente, é contratado pela Força interessada para fabricar e entregar o equipamento militar desejado.

Adotado tal procedimento, no Brasil, um produtor nacional, sujeito à jurisdição brasileira, logo em seguida, e acompanhado pelas autoridades militares, prepara e firma o acordo com o supridor estrangeiro, com todas as cláusulas aprovadas pelos órgãos governamentais nacionais. Nesse processo, uma entidade industrial local passa a ser a contratante do fornecedor externo, em substituição ao governo, com toda a autoridade técnica e manufatureira necessárias.

Em havendo financiamento estrangeiro, este deveria ser contratado pelas autoridades governamentais.

Esse processo supera qualquer dúvida sobre propriedade intelectual ou transferência de tecnologia e amplia o leque de resultados, pois o diálogo se dará entre as empresas encarregadas da fabricação do produto. Cria-se uma vinculação de longo prazo, certamente útil para a operação de produtos tão sofisticados como os modernos equipamentos militares.

Essa forma de fornecer um produto estrangeiro para uma Força Armada brasileira já tem exemplo nacional.

Logo no início da vida produtiva da Embraer, em 1970, o então Ministério da Aeronáutica contratou a empresa, na época ainda recém-criada, para produzir o jato de treinamento AT-26 Xavante.

Seguindo os procedimentos descritos, a Embraer contratou a fornecedora italiana Aermacchi, selecionada numa competição semelhante à que vivemos na atualidade.

Essa diretriz governamental resultou num programa muito bem-sucedido. Vários dividendos adicionais foram conseguidos e, entre eles, foi possível que os aviões fabricados pela Embraer pudessem ganhar o status de produto próprio, permitindo sua exportação.

Nos limites de uma proposta dessa natureza, os benefícios são marcantes, em nada alterando a discussão, hoje pública, quanto ao avião ou fornecedor a ser escolhido, os quais podem ser aqueles decididos pelas autoridades conforme os ditames das políticas governamentais.

O mérito da proposta está provado por inúmeras iniciativas do mesmo tipo em vários países do mundo e, como acentuado, parte de um exemplo também já ocorrido no Brasil, quando do lançamento pela FAB da indústria aeroespacial brasileira, muito bem-sucedido, implantado há 40 anos em São José dos Campos (SP).

EMANUEL FERNANDES, 54, engenheiro aeronáutico formado pelo ITA, deputado federal pelo PSDB-SP, é presidente da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados. Foi prefeito de São José dos Campos (1997-2004).

OZIRES SILVA, 79, engenheiro formado pelo ITA, é reitor da Unimonte. Foi fundador e presidente da Embraer, presidente da Petrobras e ministro da Infraestrutura (1990-1991).

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