Brigas entre Irã e Israel podem impulsionar primeira guerra radiológica

International Herald Tribune
Bennett Ramberg

"Qualquer um que pense em atacar o Irã deve estar preparado para duros golpes e punhos de ferro". Essa foi a declaração do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, no dia 10 de novembro, em resposta aos informes que Israel poderia atacar as usinas nucleares do Irã. O risco de contra-ataques, contudo, levanta um fantasma que poucos reconhecem: a primeira guerra radiológica da história.

O general Masoud Jazayeri, vice-comandante das forças armadas do Irã, indicou o que "golpes" e "punhos" podem significar, quando advertiu no mês passado que Dimona – o centro do programa de armas nucleares nunca admitido por Israel - era "o alvo mais acessível".

Essa ameaça é muito mais do que apenas um risco ao programa de armas nucleares de Israel. Um ataque ao complexo de Dimona pode lançar na atmosfera os conteúdos radioativos do centro, impondo riscos de grande contaminação de longo prazo no local do reator e além.

Mas nesta região, em que o princípio do "olho por olho" há muito domina, a vantagem de Teerã acaba aí. Como o país agora abriga a maior usina nuclear do Oriente Médio em Bushehr, o Irã tornou-se detentor do maior refém atômico da região. Isso representa um xeque-mate israelense? Nesta parte volátil do mundo, talvez, mas não conte com isso.

Historicamente, os combatentes relutaram em atacar reatores nucleares em operação. Os EUA, por exemplo, evitaram atacar a usina de Yonbyon da Coreia do Norte para deter o programa de armas nucleares de Pyongyang, em parte por preocupações com a radiação. Já Israel tirou as luvas e bombardeou o reator de Osirak, no Iraque, em 1981, e a usina de Al Kibar, da Síria, em 2007, antes que entrassem em operação, apostando que nenhum dos dois países retaliaria atacando Dimona. A aposta valeu. O Iraque não teve a capacidade de contra-ataque e a Síria temeu as consequências de fazê-lo.

Somente em 1991, durante a primeira guerra do Golfo, vimos o primeiro ataque a uma usina operacional, quando os EUA bombardearam um pequeno reator de pesquisa no subúrbio de Bagdá. Mas o Iraque tinha retirado o material nuclear da usina antes do início da guerra. Depois disso, o governo iraquiano tentou atingir os reatores de Dimona com o lançamento de mísseis Scud. Os mísseis não atingiram seus alvos.

A recente ameaça do Irã contra Dimona pode ser mera bravata, mas sua capacidade de mísseis balísticos possibilita contra-ataques, e a declaração do general Jazayeri foi uma de muitas ameaças. Felizmente, Dimona não é nenhuma Chernobyl ou Fukushima. Seu reator é relativamente pequeno e, como é usado para a fabricação de armas, seu combustível é substituído com mais frequência, reduzindo o inventário radioativo. É possível também que Israel nem opere a planta continuamente.

Por outro lado, após décadas de serviços, as instalações adjacentes – algumas subterrâneas - que guardam combustível usado, lixo atômico e plutônio podem acrescentar significativamente às consequências de um ataque de míssil balístico do Irã.

Os efeitos radiológicos dependeriam do volume e da natureza dos isótopos nucleares liberados, dos ventos e das medidas de proteção. Modelos de computação sugerem que até mesmo o inventário relativamente pequeno da usina poderia provocar um vasto aumento em casos de câncer, defeitos de nascença e outras doenças, em uma região muito mais ampla do que a zona imediatamente ao redor do reator e de comunidades próximas.

Também haveria muitas consequências socioeconômicas preocupantes. As autoridades teriam que restringir o consumo de alimentos das regiões mesmo modestamente contaminadas e exigir a evacuação de distritos comerciais, industriais e residenciais nos pontos de maior atividade radioativa. Os acidentes nucleares na Ucrânia e no Japão sugerem um enorme aumento em doenças relacionadas ao estresse. O custo para tratar dessas questões acrescentaria aos bilhões de dólares que os governos teriam que gastar em limpeza nuclear.

Bushehr, diferente de Dimona, tem um reator nuclear muito grande. Localizada no Norte do Golfo, a usina só começou a operar parcialmente em setembro. Entrará em pleno vapor no início do ano que vem, e acumulará elementos perigosos em sua operação.

Se um ataque militar atingir a usina em plena capacidade após meses de operação, a liberação de radioatividade pode ser maior do que a de Chernobyl. Os ventos comuns do Norte e Noroeste carregariam o material radioativo ao longo do Golfo por regiões pouco populosas. Diante do tamanho da planta de Bushehr, as lições de Chernobyl e Fukushima nos dizem que o peso para o Irã da limpeza radioativa, da perda em produção de energia e dos custos médicos e do reassentamento da população podem alcançar centenas de bilhões de dólares em décadas.

Apesar desses cenários sombrios, tanto Israel quanto o Irã podem atenuar os riscos desse tipo de incidente, usando algumas estratégias que vão além das imperfeitas defesas de mísseis hoje atuantes. Isso incluiu o fechamento das usinas em tempos de crise e a remoção dos elementos radioativos para pontos mais seguros, como fez o Iraque em 1991. Israel pode perder Dimona permanentemente, dada a idade da usina e o cumprimento de sua função – o velho reator gerou todo o plutônio para as armas que o país produziu. O fechamento também ajudaria simbolicamente a reduzir as tensões nucleares na região.

Dados os perigos, Israel e Irã fariam bem em se perguntar se abrir uma caixa de Pandora radiológica de fato serviria aos seus interesses.

* Bennett Ramberg foi analista político do Escritório de Assuntos Político-militares do Departamento de Estado sob o presidente George H. W. Bush. 

 
Tradução: Deborah Weinberg - UOL Notícias
 

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