'Rubens Paiva foi torturado e não me entregou'

Atual vice-prefeito do Rio e militante clandestino na ditadura, Muniz é um dos elos perdidos do desaparecimento do deputado

Miriam Leitão – O Globo

Os militares que capturaram Rubens Paiva, em 20 de janeiro de 1971, diante da família, queriam saber a identidade de Adriano. Deputado cassado pela ditadura, Rubens Paiva, mesmo sob tortura, não contou quem ele era nem que iria à sua casa naquele dia. Hoje, Adriano, elo perdido do caso Rubens Paiva, está sentado na cadeira de vice-prefeito e secretário de Meio Ambiente do Rio. Seu nome é Carlos Alberto Vieira Muniz.

Um relato escrito por uma professora, hoje aposentada e doente, revela detalhes do sofrimento de Rubens Paiva na Aeronáutica e no Exército. Há também uma prova física que desmente a afirmação, sustentada até hoje pelos militares, de que não sabem o que houve: um recibo com carimbo do Exército prova que o carro do deputado estava na Polícia do Exército.

A história nunca foi apurada porque os militares sempre impediram, com notas e ameaças, que se buscasse informação sobre esse e outros mistérios macabros do regime.

Muniz, o Adriano, era do Movimento Revolucionário 8 de Outubro, o MR-8, de Carlos Lamarca.

Os órgãos de segurança procuravam os sequestradores do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher, trocado por 70 presos. Rubens Paiva conhecera Adriano quando tirou do Brasil a filha de um amigo, ameaçada de prisão. Rubens Paiva não tinha ligação com grupo clandestino. Mais de 40 anos depois, Muniz recebeu a GloboNews e O GLOBO.

- Eu era o Adriano. Sou um sobrevivente. Rubens foi barbaramente torturado e não me entregou. Ele não era pombo-correio, não pertencia a grupo armado, não conhecia Lamarca. Rubens era uma referência, por sua grande experiência política. Gostava de trocar ideias com todos que estavam na oposição, inclusive os mais jovens, sobre a redemocratização e ajudava perseguidos a sair do Brasil.

Naquele dia, Muniz ligou para Rubens Paiva e confirmou que iria lá. Eunice (mulher do deputado) o protegeu.

- Ela, sempre afetuosa, atendeu nervosa e disse "Não, Rubens não está", e me passou a sensação de que algo estava acontecendo. Era a polícia dentro da casa - diz Muniz.

Homens da Aeronáutica mantinham Eunice e filhos sob a mira de metralhadora, ouvindo os telefonemas pela extensão. Rubens já estava apanhando na 3 Zona Aérea do notório brigadeiro João Paulo Burnier. De lá, foi levado para a PE da Barão de Mesquita ouvindo pelo rádio do carro instruções:

"Na casa da Delfim Moreira há uma senhora e quatro crianças. Quem está dentro não sai, quem está fora pode entrar, mas é grampeado". Rubens sabia: era a sua casa e sua família sob ameaça.

*Especial para O GLOBO

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