Frágil cessar-fogo

Ativistas acusam o ditador sírio, Bashar Al-Assad, de violar o plano de paz de Kofi Annan e de matar ao menos 10 civis. Conselho de Segurança da ONU deve decidir hoje sobre o envio de monitores ao país

RODRIGO CRAVEIRO – CORREIO BRAZILIENSE

O primeiro dia do cessar-fogo determinado pelo plano de paz de Kofi Annan — enviado da Liga Árabe e das Nações Unidas a Damasco — foi marcado pela desconfiança e por uma frágil e aparente tranquilidade. "A implementação da Convenção Annan não mudou em nada a situação em Homs. Apesar de bombardeios menos frequentes, os franco-atiradores mataram 10 civis, incluindo duas crianças e uma mulher. E o Exército está onipresente, com blindados em áreas residenciais", relatou ao Correio, pela internet, o estudante Yazan Homsy, 33 anos, morador do bairro de Talkalakh, na cidade situada a 141km de Damasco e considerada o berço do levante contra o ditador Bashar Al-Assad. Segundo o Conselho Revolucionário de Homs, um dos órgãos da oposição, a trégua foi interrompida pelos franco-atiradores, pelo disparo de morteiros e pela atividade das forças do regime.

Em relatório enviado ao Conselho de Segurança da ONU, Annan esboçou otimismo. "A Síria aparentemente está experimentando um raro momento de calma. Isso está trazendo o alívio e a esperança para o povo sírio, que tem sofrido tanto, e por tanto tempo, nesse conflito brutal. A trégua agora deve ser mantida", afirmou. Horas depois, ele confidenciou a diplomatas que Damasco não cumpre com todos os termos do plano. Annan pediu à ONU que ordene a retirada das tropas e das armas pesadas das cidades sírias.

Outro morador de Homs, o ativista Waleed Fares, 25 anos, acusou Al-Assad de violar o cessarfogo.

"Tivemos hoje ao menos sete mortos, vítimas de franco-atiradores. Os militares ainda realizam operações de menor escala na cidade", comentou. Hillary Clinton, secretária de Estado americana, trata o silenciar das armas como um detalhe. "Se for respeitado, o cessar-fogo é um passo importante, mas é só um elemento do plano (de Annan)", declarou, às margens da cúpula do G-8 (grupo formado pelos sete países mais industrializados e pela Rússia).

Integrante do Conselho Nacional Sírio (CNS), Ausama Monajed (leia Três perguntas para) disse ao Correio ter a mesma preocupação de Hillary. "Há seis pontos no plano de Annan, que incluem a libertação de todos os presos políticos, a permissão para o povo se manifestar pacífica e livremente e a autorização para jornalistas estrangeiros entrarem no país", lembrou, por e-mail. "Nada disso ocorreu."

O regime de Damasco culpou "terroristas" pela morte de um oficial do Exército, em Aleppo, a segunda maior cidade do país. "Um grupo terrorista armado usou um explosivo para atingir um ônibus transportando oficiais, em Aleppo. Ele matou um tenente-coronel e feriu 24 pessoas, às 8h (2h em Brasília)", informou a agência de notícias estatal Sana. O Exército Livre Sírio negou envolvimento e atribuiu o ataque às próprias forças de segurança e à milícia alauíta Shabiha, obediente a Al-Assad.

Batalha diplomática

Ante a situação volátil na Síria, o governo dos EUA aposta as fichas na tentativa de pressionar a Rússia a adotar uma postura mais incisiva com Al-Assad, um de seus principais parceiros comerciais.

Hillary Clinton manteve reuniões ontem com os chanceleres Alain Juppé (França) e Sergei Lavrov (Rússia). O próprio Juppé chegou a propor ao Conselho de Segurança o envio à Síria de "uma força robusta de observadores", cuja objetivo será o de verificar o cumprimento do cessar-fogo.

Havia a expectativa de que o esboço de uma resolução nesse sentido fosse apresentado ontem no Conselho. Tanto a Rússia quanto a China mostraram simpatia pelo texto. "Apoiamos integralmente o plano de seis pontos de Annan e cremos que o cessar-fogo é muito importante, assim como a retirada de tropas das cidades sírias", declarou Li Baodong, embaixador da China na ONU, citado pela agência Reuters. "É crucial que os monitores estejam no terreno", afirmou Vitaly Churkin, o representante da Rússia no Conselho de Segurança. A votação sobre o envio de observadores deve ocorrer ainda hoje.

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