Guerra Israel-Hamas: entenda por que os países árabes do Golfo têm reações diferentes

No Médio Oriente, as reações à ofensiva do Hamas contra Israel são mistas, inclusive entre os países árabes do Golfo.


RFI

Certos Estados, como o Catar ou o Egito, tentam desempenhar um papel de moderador para acalmar os ânimos, o que parece improvável no futuro imediato dada a escala do conflito. Outros não deixam dúvidas de que lado estão.


“Nenhuma negociação” é possível neste momento com Israel", disse à AFP um responsável do Hamas, radicado em Doha, na segunda-feira (9), durante o terceiro dia da ofensiva militar lançada pelo movimento islâmico palestino contra Israel.

“A operação militar continua e a resistência, liderada pelas Brigadas Al-Qassam (braço armado do Hamas), continua a defender os direitos do nosso povo. Atualmente, não há negociação possível sobre a questão dos prisioneiros ou outra” com Israel, disse Hossam Badrane, membro do gabinete político do Hamas na capital do Catar. “A nossa missão agora é fazer todo o possível para evitar que a ocupação continue a cometer massacres contra o nosso povo em Gaza, que visam as residências dos civis", afirma.

Sobrevivência de Gaza

Entretanto, poderia o Catar, o país que sedia um escritório do movimento palestino Hamas, e com quem mantém relações financeiras estreitas, desempenhar um papel de mediação? “O Catar contribuiu para reabastecer os cofres do Hamas”, destaca Hasni Abidi, diretor do Centro de Estudos e Pesquisas sobre o Mundo Árabe e o Mediterrâneo, especialmente bancando o pagamento dos salários dos funcionários da administração pública em Gaza.

Além disso, “Doha financia a sobrevivência da Faixa de Gaza, em acordo com o Estado de Israel. Sabemos, portanto, que o Catar tem os meios para influenciar o Hamas”, sublinha Agnès Levallois, vice-presidente do Instituto francês de Investigação e Estudos do Mediterrâneo e Oriente Médio.

Doha também é frequentemente citada como facilitadora da libertação de reféns na região, o que poderia contribuir para “esforços conjuntos” com o Egito para restaurar a calma em Israel, acreditam os especialistas. O Catar declarou explicitamente, no entanto, que considera “Israel o único responsável pela atual escalada" da violência.

Segundo informações de uma fonte citada pela Reuters, mediadores do Catar mantiveram conversas urgentes, na segunda-feira (9) com responsáveis do Hamas para tentar negociar a libertação de mulheres e crianças israelenses capturadas pelo movimento e detidas em Gaza, em troca da libertação de 36 mulheres palestinas e crianças das prisões israelenses.

As negociações haviam registrado “alguns progressos”, disse à AFP uma fonte próxima do assunto, sem fornecer mais detalhes. No entanto, nesta terça-feira, Majed Al-Ansari, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Catar, indicou que é "muito cedo" para que uma mediação seja realizada sobre a questão dos reféns. "Acho que precisamos ver como vai evoluir a situação", afirmou.

Reações divergentes em outros países do Oriente Médio

Em outros países do Oriente Médio, as reações são múltiplas. A primeira reação dos Emirados Árabes Unidos, publicada no sábado (7), dia do ataque do Hamas, foi neutra. Abu Dhabi contentou-se em pedir calma. Na segunda-feira, a monarquia do Golfo disse estar “consternada” com a tomada de reféns de civis israelenses, descrevendo “os ataques do Hamas às cidades e aldeias israelenses (…) como uma escalada séria e grave”, conforme relatou o correspondente da RFI Nicolas Keraudren.

Uma posição com a qual o reino do Bahrein também se alinhou. Estes dois países do Golfo e o Marrocos são signatários dos Acordos de Abraão. Os pactos, assinados em 2020 sob a égide da administração americana de Donald Trump, estabelecem a normalização das relações com o Estado judeu. Isto explica, em parte, as posições divergentes entre os países árabes do Golfo sobre a ofensiva do Hamas.

Apoio financeiro ao Hamas

Outro ponto a ser levado em consideração é que o Hamas se beneficia do apoio financeiro de vários países, como o Catar e a Turquia. O maior doador continua sendo o Irã: US$ 100 milhões de por ano, segundo informações do Departamento de Estado Americano, de 2020.

Nesta manhã, o Aiatolá Ali Khamenei, a maior autoridade do Irã, negou que o país esteja por trás do ataque do Hamas em Israel. "A cooperação do Irã com o Hamas não é nova, mas eu não vejo Teerã tomando o risco de uma conflagração regional”, acrescenta Agnès Levallois.

Outra parte importante do financiamento do grupo palestino Hamas vem da tributação. Apesar do bloqueio de suas fronteiras por Israel, a Faixa de Gaza conta com uma rede subterrânea através da qual importa produtos egípcios. Calcula-se que todos os meses, o movimento islâmico arrecada US$ 12 milhões graças aos impostos que impõe ao Egito.

Príncipe saudita diz evitar que conflito se espalhe

A Arábia Saudita, envolvida em negociações de normalização com Israel, por sua vez, não poupou palavras para acusar “as forças de ocupação israelenses” de estarem na origem de “uma situação explosiva”.

O príncipe herdeiro Mohammed bin Salman afirmou ao presidente palestino, Mahmud Abbas, que o reino do Golfo continua a apoiar o povo palestino para alcançar os seus direitos legítimos a uma vida decente.

Ao mesmo tempo, o príncipe saudita informava trabalhar para evitar "uma expansão" do conflito, após o ataque surpresa do Hamas em Israel, conforme informou a mídia estatal saudita nesta terça-feira.

Bin Salman também manteve conversas telefônicas separadas com o rei Abdullah II da Jordânia e com o presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, durante as quais apelou ao aumento dos esforços internacionais para interromper a escalada em Gaza e evitar a propagação do conflito a toda a região.

Em entrevista à Fox News, no mês passado, Mohammed bin Salman havia dito que a questão da Palestina era "muito importante" para a Arábia Saudita, país que abriga os locais mais sagrados do Islã, em Meca e Medina.

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