Família cobra explicações do Exército

Folha de Boa Vista

A morte do cabo do Exército Brasileiro Jairo Sousa Barbalho, 22, gerou diversas dúvidas entre familiares e amigos, que não acreditam em homicídio. Muito abalados com a trágica morte, eles cobram explicações das autoridades competentes para que o caso seja investigado com rigor.

Segundo a mãe do militar, a técnica em enfermagem Maria Rodrigues Barbalho, desde o final do mês de julho deste ano, que o filho estava no 5º Pelotão Especial de Fronteira (PEF), localizado em Auaris, na terra indígena Yanomami, fronteira com a Venezuela. “Era muito difícil mantermos comunicação com ele, pois os telefones e a internet não funcionavam”, contou ela.

Muito emocionada, a mãe de Barbalho lembrou que, tão logo o filho entrou no Exército, no discurso de apresentação todos os pais eram consolados. “Eles pediam que nós ficássemos com os corações tranquilos, pois aquele filho que fosse mau, ou mesmo o que fosse bom, voltaria melhor ainda e aprenderia, por exemplo, princípios de obediência e liderança, mas o que é ter um filho bom de volta? É um filho morto como recebi o meu? Não tem tristeza maior para uma mãe do que ver seu filho retornando dentro de um caixão. Eu ainda não consegui acreditar em tudo o que aconteceu e no que ainda está acontecendo. Além de triste, é duvidoso. Meu filho tinha um brilhante futuro, e apesar de tudo, o Exército era a vida dele”, disse Maria.

Ela lembrou ainda que, desde outubro passado, fora informada por sua irmã que o filho estava passando por problemas de saúde, atestado pelo médico do Exército que não teve o nome divulgado.

Segundo o laudo, Barbalho sofria de depressão e requisitava sua transferência para a Capital para dar início ao tratamento. “Se meu filho sofria de depressão, considerado um dos males do século, por que não autorizaram o retorno dele a Boa Vista?”, questiona.

A mãe do militar contou que o filho era evangélico e sempre foi “um exemplo de dignidade e disciplina aos familiares”. Ele ingressou no Exército há quase dois anos como soldado. Em seguida, fez prova para cabo e passou em 2º lugar. Posteriormente, após os resultados dos exames práticos e físico, teria alcançado o 1º lugar.

O padrasto do militar, o médico pediatra Luiz Chaves, disse que a família nunca teve acesso aos prontuários médicos do cabo. “Nunca conseguimos nenhuma informação concreta a respeito da doença dele. Mas o que aconteceu com a nossa família deve servir de alerta às autoridades para que o fato não se repita. Também não sabemos o tempo limite de permanência de cada militar no PEF. Mesmo assim, acredito que qualquer pessoa, independente de ser ou não militar, não deva permanecer durante tanto tempo isolada do mundo e principalmente da família”, ressaltou o médico.

“Ele sempre dizia que uma das maiores dificuldade em retornar para Boa Vista era a falta de aeronaves. Engraçado, quando ele morreu, em poucas horas uma avião já estava lá para fazer a remoção, enquanto que, quando doente, ele não foi transferido. Isso é o mais difícil de compreender”, disse a irmã do cabo, a universitária Jarlane Barbalho.

Familiares contaram que a morte foi constatada por volta das 11h de quinta-feira, mas somente às 14h, três horas depois, a família foi comunicada. “Sabemos que para a morte não tem jeito, mas por que demoraram tanto para nos avisar?”, questionou a mãe do militar.

O CASO - Jairo morreu com um tiro de uma arma 9 mm Bereta. De acordo com uma fonte da polícia, o tiro entrou por baixo do queixo e saiu em cima na cabeça, o que provocou hemorragia cerebral e traumatismo craniano.

Militares afirmam que pelotão de Auaris está em más condições

Militares e amigos do cabo do Exército Jairo Sousa Barbalho enviaram diversos e-mails à Folha denunciando a situação vivenciada por militares não-oficiais que atuam nos pelotões de fronteira de Roraima.

Entre as principais denúncias está o enorme tempo que os militares permanecem no pelotão, às vezes ultrapassa os quatro meses, a dificuldade para retornar à capital, por conta da escassez das aeronaves e a falta de comunicação dos militares com o resto do mundo, ficando confinados e incomunicáveis por falta de internet e de orelhões. Outro fato relatado nos e-mails é a falta de energia elétrica no local. Por falta de combustível, o gerador só funciona 8 horas por dia.

Um dos militares, que preferiu não ser identificado, conta que os oficiais possuem botijas de gás para o preparo de seus alimentos, enquanto os cabos e soldados precisam cortar lenha na mata para cozinhar sua comida.

Outra denúncia foi com relação ao comércio ilegal de materiais de diversos gêneros. Um exemplo citado foi a venda de um refrigerante de dois litros a R$ 8,00, o dobro do praticado em Boa Vista. “Esse produto é trazido em uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) por quem tem regalia e acaba se aproveitando disso, uma vez que nem sempre nossos familiares conseguem nos enviar comida ou qualquer outra coisa de nossa preferência, porque nem sempre tem avião para trazer”, explicou um dos militares.

Os militares que entraram em contata com a Folha relatam ainda a venda para as comunidades indígenas de animais destinados à alimentação da tropa. “Isso aqui é um quartel ou um botequim que vende de tudo?”, questionou observando que quem se recusa a ir para o pelotão sofreria ameaças.

Comandante diz que vai apurar denúncias

O general de Brigada Carlos Neiva Barcellos, comandante da 1ª Brigada de Infantaria e Selva, que está no Rio de Janeiro (RJ), conversou com a Folha ontem por telefone e garantiu que todas as denúncias, assim como os motivos e as causas da morte do cabo Jairo Sousa Barbalho, serão investigadas e esclarecidas.

“O Exército Brasileiro é uma instituição séria. Neste momento de tristeza nos solidarizamos com a família. Sabemos da dor da perda. Infelizmente ocorreu uma fatalidade. O que podemos fazer no momento é garantir que tudo seja investigado, para isso necessitamos de tempo”, explicou o general.

Ainda segundo o comandante, todos os militares que fazem parte do Pelotão Especial de Fronteira (PEF) em Auaris realizam diversas missões “nobres e específicas em defesa da Pátria”. “Isso acontece em todos os PEFs da Amazônia. Sabemos que Auaris e Surucucus, por serem pelotões distantes, passam por diversas dificuldades. Não estamos alheios a isso, mas mensalmente uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) realiza o reabastecimento não só com alimentos, mas de toda a parte logística necessária”, garantiu.

Com relação à falta de aeronaves para atender principalmente os militares que passam por algum problema de saúde, o general garantiu: “Quando os sintomas mostram que o militar deva ser removido de imediato, a evacuação é feita não só pelas aeronaves da FAB e do Exército como também as civis. Nunca aconteceu de um militar não ser removido em caso de emergência ou estado de saúde grave”, explicou.

O general disse ainda que as supostas irregularidades denunciadas serão apuradas. “Posso garantir que não existe nenhum tipo de corporativismo. Com relação à morte, um Inquérito Policial Militar (IPM) já foi instaurado. O prazo é de 40 dias, podendo se estender para mais 20”.

O chefe de Estado Maior da 1ª Brigada, coronel Pastori, disse que a regulamentação interna dos PEFs estabelece que os militares podem passar até quatro meses no pelotão. Após esse período, têm direito ao “arejo” (folga), que varia de 15 a 30 dias, de acordo com a ida da aeronave para o local.

“Atualmente temos 29 militares em Auaris, pois dos 66 destacados para o local, a grande maioria está de férias, mas outros já estão sendo remanejados para suprir as necessidades”, explicou o coronel.

O militar disse ainda que a pista de pouso de Auaris está deteriorada em consequência do tempo. “A pista só pode receber aeronaves pequenas, mas isso também não interferiu nos trabalhos realizados no local. Equipes da Comissão de Aeroportos da Amazônia, ligadas à FAB, já estão fazendo a recuperação do local”, lembrou.

INVESTIGAÇÃO - Um avião militar seguiu para Auaris ainda na semana passada, levando peritos do Exército e três da Polícia Federal, para fazer uma perícia detalhada do local e tentar colher dados que levem a esclarecer o caso. O general frisou que somente no final do IPM é que o Exército irá se pronunciar oficialmente sobre a morte do cabo.

Com relação à possível doença de depressão o coronel Pastori garantiu que irá apurar diretamente com o médico que teria atendido o cabo.

1 Comentários

  1. Infelizmente este será mais um caso que acontece com os nossos filhos nas forças armadas que será acobertada a verdadeira causa da morte. mais uma vez fica provbado que o sentimento alheio não vale absolutamente nada...


    declaração indignada do pai do cabo Barbalho...

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