Farmácia da Marinha salva a vida de doentes crônicos na Serra Fluminense

Marcelo Dutra - O Globo

RIO - O suprimento de remédios da farmácia do Hospital de Campanha do Grupamento Operativo dos Fuzileiros Navais, montado na prefeitura de Friburgo após as chuvas que atingiram a cidade, tem feito uma enorme diferença na vida de centenas de doentes crônicos. De acordo com o capitão de Mar e Guerra Yerson de Oliveira, moradores que sofrem de diabetes, insuficiência renal, hipertensão, problemas cardíacos e até mesmo de problemas emocionais graves só estão conseguindo medicação graças a essa alternativa. 

Quando não levados pelas águas, os remédios foram deixados para trás por pessoas que abandonaram seus lares com pressa. Vazias ou destruídas, as farmácias locais também nada podem fazer. 

- São pacientes que utilizam estes remédios para sobreviver. O diabético, por exemplo, não pode abrir mão da insulina. Mas na fuga, tudo foi deixado para trás ou se perdeu. Aqui, o paciente é examinado por nossos médicos e, constatada a necessidade, ele é atendido - contou o comandante, que não é médico, mas coordena toda a administração do local: 

- Também estamos ajudando as equipes de socorro a chegar nas áreas isoladas - contou, mostrando o caminhão usado pela equipe, o mesmo usado no Rally Paris-Dakar, segundo o comandante. 

O comandante, que já participou de campanhas no Haiti e no Chile, à época do terremoto naquele país, conta que costumava gabar-se de só chegar as lágrimas por suas filhas. 

- Posso te dizer, com toda a sinceridade, que eu, mesmo sendo um militar experimentado, mudei minha concepção de sofrimento ao ver o que se passa aqui em Friburgo. Não há como lidar com essas gente e não ser solidário - diz, abrindo mão da formalidade militar. 

Yerson explica que está à frente de uma tropa composta por 167 militares: 27 médicos, profissionais de saúde e soldados. Mas que, para cumprir essa missão, não abriu mão dos "marinheiros de primeira viagem e sem farda" diz ele, se referindo aos voluntários que ajudam no cadastramento dos pacientes na área de ação social entre outras tantas necessidades. 

- A tragédia nos obriga a trabalhar de mão dada com vários segmentos da sociedade, e isso tem sido prazeroso - conta o comandante enquanto brincava com uma jovem que há quatro dias não abandona seu posto munida de um laptop à frente de uma pequena fila de pacientes. 

_ Já mandei essa para casa, mas fazer o quê? Ela não vai - brinca o comandante. 

A todo instante chegam novos pacientes à farmacia climatizada do Hospital da Marinha em busca de medicamentos. São idosos, jovens e casais em busca de alívio. Joana Angélica da Silva, de 67 anos, hipertensa como a irmã Lourdes, de 63, só abandonaram o semblante preocupado após o atendimento dos médicos. 

- Eles estão sendo anjos. Conversaram com agente, nos deram carinho e nos ajudaram a conseguir os remédios. Já pensou escapar da chuva, do trauma dessa guerra toda, e morrer por que não tomou os remédios de pressão? Não mesmo!_ disse, já de bom humor. 

Segundo o capitão Carlos Mesquita, diretor das Unidades Médicas Expedicionárias da Marinha, o hospital está recebendo um grande número de pacientes com lacerações, fraturas e, principalmente, traumas emocionais. 

- Atendemos a mais de 500 pessoas em quatro dias. Até agora (por volta das 12h de domingo), ainda não foi necessária nenhuma intervenção cirúrgica mas estamos preparados para isso. Muitos precisam é de carinho e atenção nessa hora. Um dos primeiros que atendemos aqui foi um senhor que perdeu a esposa e três filhos. Cuidamos dos ferimentos dele, que estava fisicamente bem, mas não quis ir embora. Perguntei pelos vizinhos dele e ele disse que os havia perdido também e que não tinha a menor ideia para onde ir. Então ele ficou aqui, comendo, dormindo e andando conosco até sábado, quando eu consegui conduzí-lo a asistência social. As feridas da alma demoram muito mais a curar - contou o capitão.

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem