Presidente da Síria acusa Turquia de fornecer armas a opositores

Segundo jornal turco, Assad afirmou que não vai tolerar um Estado islâmico e acusou Ancara de proteger Irmandade Muçulmana
iG São Paulo

O presidente da Síria Bashar Al-Assad acusou a Turquia de fornecer armas a grupos opositores no país, além de proteger a organização islâmica fundamentalista Irmandade Muçulmana, informou nesta sexta-feira a imprensa turca. As declarações de Assad, publicadas pelo jornal Cumhüriyet, foram feitas em Damasco para uma delegação do Partido Republicano do Povo (CHP, oposição turca).

O líder sírio, cuja família está há 41 anos no poder, também justificou o elevado número de vítimas em manifestações realizadas nas ruas do país nos últimos meses. Para Assad, a inexperiência da polícia e do Exército para controlar os grandes protestos sociais no país árabe aparece como o principal fator. "Levarei adiante todas as propostas exigidas pelos reformistas. Algumas até já foram alcançadas, mas ainda existem a Irmandade Muçulmana e a Al-Qaeda. A Síria é o único Estado árabe secular e não tolerarei um Estado islâmico", assegurou o presidente.

"Achamos deplorável que a Turquia se comporte como um protetor da Irmandade Muçulmana", comentou Assad, depois de afirmar que armas turcas tinham sido encontradas nas mãos de militantes sírios. "A Turquia não pôde fazer emendas na Constituição em 30 anos, porém, querem nossa democracia (na Síria) estabilizada em três meses. Querem que eu deixe o poder. Convocarei eleições gerais e respeitarei os resultados. Vendo que os causadores de distúrbios não ganham apoio popular, eu poderei alcançar a maioria dos votos", acrescentou. O presidente sírio também criticou a Turquia por ter estabelecido campos de refugiados sírios em seu território, na região fronteiriça.

Nesta sexta, o governo sírio fechou as portas do país à comissão organizada pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU criada para investigar crimes contra a humanidade praticados pelas forças de repressão. O regime de Assad rejeitou receber qualquer proposta ou análise do Ocidente nessa questão.

A Síria participou do Exame Periódico Universal (EPU), a que se submetem todos os membros da ONU desde 2006 para avaliar a situação dos direitos humanos em cada país da organização. Com o crescimento da violência, inclusive com informações sobre enfrentamentos entre as forças armadas e desertores na fronteira com o Líbano, a expectativa para escutar o discurso do vice-ministro de Exteriores da nação asiática, Faisal Mekdad, foi grande em Genebra.

O dirigente, porém, não fez nenhuma concessão. Sua exposição diante do Conselho de Direitos Humanos se concentrou em denunciar "uma conspiração internacional" após o início dos protestos contra Assad. O ministro garantiu que as reformas democráticas estão em andamento e que os sírios gozam de liberdade de expressão e manifestação.

Mekdad assegurou que nesses seis meses "as forças de segurança evitaram disparar contra rebeldes para evitar a morte de civis inocentes" e qualificou as manifestações como "ataques criminosos contra a nação e o povo por parte de grupos terroristas". Segundo o dirigente, a agitação civil é uma estratégia do Ocidente, liderado pelos Estados Unidos, para armar grupos oposicionistas, que assassinaram civis indefesos.

O discurso do vice-ministro contou com o apoio de Cuba, Venezuela, Nicarágua, Bolívia e Rússia, que afirmam que o Conselho está se tornando uma ferramenta dos países ocidentais para conseguir seus objetivos. Em tom enérgico, Mekdad disse ter problemas em "manter a linguagem diplomática" diante do que considerou "mentiras e desinformação". Ele argumentou que interferir nos assuntos internos de outro país é um delito contemplado no direito internacional.

Um dia após a ONU elevar para 2,9 mil o número de mortos pela repressão governamental, o vice-ministro sírio informou que nos próximos dias Damasco apresentará sua "lista de mártires". "Trata-se dos 1,1 mil policiais e membros das forças de segurança que faleceram nas mãos dos terroristas que recebem armas de países inimigos", denunciou o representante sírio.

Muitos países ocidentais pediram a Damasco que autorize a entrada sem obstáculos da comissão. A França convocou a Síria "a ouvir as demandas da comunidade internacional pondo um fim imediato à repressão e ao clima de terror que impôs a sua própria população". "A própria Alta Comissária para os Direitos Humanos considerou que alguns dos crimes podem ser qualificados de crimes contra a humanidade", destacou o representante da França na ONU, Jean-Baptiste Mattei.

Reino Unido e Estados Unidos também pediram a libertação imediata e sem condições de todos os prisioneiros políticos. "Um governo que não respeita a vontade de seu povo, que nega os direitos fundamentais de seus cidadãos e opta por governar por meio do terror e da intimidação não pode ser considerado legítimo e deve renunciar imediatamente", declarou a embaixadora americana Betty King.

Quando diversos embaixadores receberam denúncias de torturas, de desaparecimentos e de violência infligidos à população pela polícia, o representante sírio rejeitou as acusações, afirmando que as forças policiais nem mesmo estavam armadas.

A Síria obteve o apoio do representante russo, que afirmou que "a oposição prefere recorrer ao uso de armas", destacando, pelo contrário, as "medidas adotadas" por Damasco "com o objetivo de ampliar a liberdade dos cidadãos". Já a China destacou o princípio da ingerência nos assuntos internos de um país.

No entanto, o representante chinês reconheceu que está "preocupado com a virada dos acontecimentos" e convocou "todas as partes a dar provas de moderação".

O Conselho de Direitos Humanos da ONU realizou esse ano duas sessões especiais tendo a Síria como tema central e aprovou no mês passado o envio de uma comissão independente para investigar possíveis crimes contra a humanidade durante a repressão aos protestos, denunciados pelo Alto Comissariado de Direitos Humanos.

O governo sírio se comprometeu a permitir o acesso da comissão, que há duas semanas espera em Genebra autorização oficial de Damasco para viajar. "A Síria deve cooperar com o Conselho de Direitos Humanos, admitir a comissão de investigação e pôr fim às repressões violentas", afirmou o embaixador espanhol, Agustín Santos.

Mekdad, no entanto, descartou qualquer possibilidade imediata de colaboração com a comissão ao término da sessão do EPU, quando foi interpelado por jornalistas. O vice-ministro explicou que só autorizará a entrada no país da comissão "quando terminar o terrorismo" da oposição. O dirigente declarou que deve reunir-se com os três membros desta comissão, mas esclareceu que a visita depende de uma investigação prévia do governo sírio.

Os três membros escolhidos para integrar a comissão, cujo líder é brasileiro, já começaram a trabalhar em Genebra e disseram em entrevista coletiva que esperam se reunir com as autoridades sírias. O previsto inicialmente é que a comissão finalize sua inspeção no final de novembro.

Protestos

Milhares de sírios voltaram às ruas nesta sexta-feira para protestar contra o regime de Assad na Síria, onde pelo menos sete civis morreram, segundo ativistas. O Observatório Sírio de Direitos Humanos afirmou que quatro foram mortos na cidade central de Homs, quando forças do governo abriram fogo contra centenas de manifestantes.

O grupo disse também que atiradores deixaram três mortos em Douma, subúrbio de Damasco, um dos poucos distritos da capital síria que ainda não tinham sido palco de protestos. Manifestações contra o regime foram realizadas na maioria dos bairros de Homs, um dos redutos do protesto.

Em Deir Ezzor, ao leste, centenas de manifestantes protestaram depois da oração da sexta-feira e as forças de segurança dispararam para dispersar militantes em Maaret al Numan, na província de Idleb, perto da fronteira turca, deixando cinco feridos.

Com AFP, AP e EFE

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