Custo operacional e tecnologia aberta favoreceram suecos

Escolha pelo favorito da FAB reforça diferença com Lula, que preferia os Rafale


Leonardo Guandeline e Chico Otávio | O Globo

Para uma Aeronáutica que trabalha em meio expediente, para poupar os gastos com o rancho da tropa, o baixo custo operacional foi um dos fatores decisivos para a escolha do caça sueco Gripen NG (Saab). Por ser monomotor e dispensar o sistema de pós-combustão para atingir a velocidade supersônica, a chamada capacidade supercruise, a aeronave tem um gasto com a hora-voo significativamente inferior ao do caça americano F-18 e do francês Rafale, que também disputavam a concorrência.

Outro ponto importante foi a transferência de tecnologia. O projeto chegará com um software básico, permitindo que a indústria local introduza no coração do sistema da aeronave elementos que garantam a integração de armamentos nacionais e outras tecnologias. O Brasil poderá, ainda, sair da condição de comprador para fornecedor do caça para o mercado internacional. Já é assim, por exemplo, com os caminhões da sueca Scania, cuja filial brasileira já exporta mais unidades do que a matriz europeia. 




O Gripen sempre foi o avião preferido da Aeronáutica. João Roberto Martins Filho, ex-presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED) e especialista em estratégia militar da Universidade Federal de São Carlos (UFS-Car), explicou que a nova geração do caça (NG), ainda em fase experimental, está num estágio que permite ao Brasil o desenvolvimento das aeronaves junto com os suecos: 

— Os militares já se manifestaram a favor (dos suecos) após o Lula dizer ao Sarkozy que compraria as aeronaves francesas. Havia uma tendência desde então em optar pelo Gripen. Um outro ponto a destacar é que, com a escolha, a presidente Dilma deixa uma marca própria, de não dependência total da França nas duas maiores compras de tecnologia militar das últimas décadas no país — disse, citando, além da aquisição dos caças suecos, o projeto de construção do submarino nuclear, assinado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o então colega francês Nicolas Sarkozy em 2009.

Além da Embraer, que deverá montar o avião, outras empresas nacionais também estarão envolvidas no projeto, como fabricantes de sistema aviônicos (equipamentos eletrônicos para aeronaves), de estruturas e de armamentos — bombas e mísseis.


POTÊNCIA MAIS BARATA


A aviação de caça, para ser supersônica, precisava até recentemente injetar combustível na saída das turbinas (após-combustão), provocando o fogo visto próximo à proa do caça. O recurso, usado para aumentar rapidamente a potência, também representa um aumento de 30% (no caso do F-5) de consumo de combustível. Mas caças como o Gripen já conseguem chegar ao mesmo desempenho sem recorrer à pós-combustão. De acordo com o engenheiro aeronáutico Anastácio Katsanos, o sueco é o único monomotor operacional a dispensar o recurso (as demais aeronaves voam com dois motores).

— Motores mais recentes e refinados, como o do Gripen, são mais* econômicos. É claro que, numa situação de combate extremo, o caça sueco poderá acionar a pós-combustão — ressalvou. 


Questões geopolíticas também teriam pesado na decisão. Martins Filho aponta o preço alto da aeronave francesa e os recentes atritos diplomáticos, além da transferência limitada de tecnologia, entre Brasil e Estados Unidos como pontos fundamentais para a escolha do Gripen, produzido por um país com uma longa história de neutralidade diplomática.

— O Brasil tem tradição de procurar a tecnologia em várias fontes, em vários países. Tanto no setor naval quanto no aeronáutico o país tem condições de ganhos tecnológicos relevantes.

Expedito Carlos Bastos, pesquisador de assuntos militares da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), diz que os caças suecos, apesar da demora no anúncio da compra e da quantidade adquirida, atendem as demandas da FAB e estão "muito próximos da nossa realidade". 

— Foi uma boa escolha. Quanto à parceria com a Embraer (na concepção das aeronaves) eu acho que eles, suecos, poderão nos transferir tecnologia real. O único preocupante disso é o raio de ação (dos caças) não muito grande. As aeronaves ainda não foram experimentadas em nada - disse o especialista, acrescentando que no futuro haveria um risco se essa parceria ficasse limitada somente a Brasil e Suécia.

Para Bastos, os caças suecos, de uma só turbina, são o que o Brasil "já está acostumado" O especialista diz que os três fabricantes, em termos técnicos, não diferem muito, a exceção do preço. Ele ressalta, no entanto, que o número de caças comprados é muito pequeno para o país.

— Foi uma decisão que durou muito tempo para se comprar poucas aeronaves, insuficientes para abranger o território nacional e garantir a defesa.

Até 2018, quando a primeira unidade será entregue ao governo brasileiro, os céus do país continuarão sendo protegidos pelos F-5M, baseados em Canos (RS), Santa Cruz (RJ) e Manaus (AM), caças americanos fabricados na década de 70 e modernizados há sete anos. Porém, como eles estão no limite de uso, o contrato com os suecos abre caminho para que o governo brasileiro negocie um leasing com a Saab para o fornecimento provisório de aeronaves de uma geração anterior para reforçar a defesa aérea do país até lá.

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