Ministros israelenses cogitam planos de ataque militar contra o Irã

O governo israelense não mais acredita que sanções possam impedir o Irã de fabricar armas nucleares. Um amplo consenso a favor de um ataque militar contra as instalações nucleares de Teerã - sem os americanos, se necessário - está começando a tomar forma


Ralf Beste, Cordula Meyer e Christoph Schult | Der Spiegel

Dani Yatom, um membro do Parlamento israelense, o Knesset, foi convidado a participar de uma conferência da Otan no ano passado, em Bruxelas. Enquanto revisava a agenda, Yatom, um general aposentado, ficou surpreso ao ver que a reunião era intitulada "O Desafio Iraniano", não "A Ameaça Iraniana".

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Dani Yatom | Reprodução

Quando um representante com sotaque francês mencionou que um ataque militar americano contra as instalações nucleares iranianas seria o cenário mais perigoso de todos, Yatom disse, de forma educada mas firme: "O senhor está errado. O pior cenário seria se o Irã adquirisse uma bomba atômica".

Yatom, 63 anos, passou grande parte de sua vida nas forças armadas. Ele foi consultor militar do ex-primeiro-ministro Yitzhak Rabin e, em meados dos anos 90, foi nomeado chefe do serviço de inteligência de Israel, o Mossad. Todavia, Yatom, um membro do Partido Trabalhista, não é um "falcão" incauto. Diferente da maioria dos membros do Knesset, ele rejeita veementemente, por exemplo, uma grande ofensiva israelense contra o islamita Hamas na Faixa de Gaza.

Mas a disposição de Yatom de chegar a um acordo termina quando lhe é perguntado qual ele considera ser a melhor resposta ao programa nuclear iraniano. "Nós não mais acreditamos na eficácia das sanções", disse Yatom. "Uma operação militar é necessária caso o mundo queira deter o Irã."

Quando o ministro dos Transportes israelense, Shaul Mofaz, um ex-ministro da Defesa, expressou sentimentos semelhantes há 10 dias, eles foram vistos, especialmente na Europa, como opiniões isoladas de um linha-dura querendo marcar pontos junto ao eleitorado, em uma tentativa de suceder o primeiro-ministro Ehud Olmert. Mas na verdade agora há um consenso dentro do governo israelense de que um ataque aéreo contra as instalações nucleares iranianas se tornou inevitável. "A maioria dos membros do Gabinete israelense não mais acredita que sanções convencerão o presidente Mahmoud Ahmadinejad a mudar de curso", disse o ministro da Absorção dos Imigrantes, Yaakov Edri.

A única pergunta em torno da qual os vários grupos políticos de Israel discordam é o momento do ataque. Os "pombas" argumentam que esforços diplomáticos por parte da ONU devem ser autorizados a prosseguir até que o Irã esteja à beira de concluir a bomba. Desta forma, Israel poderia ao menos argumentar de forma convincente que todas as opções não-militares foram esgotadas.

Os falcões, por outro lado, acreditam que o tempo está se esgotando. Eles destacam que agora há "uma janela de oportunidade favorável" que se fechará com a eleição presidencial americana em novembro, e que Israel só pode depender de apoio americano enquanto o atual presidente americano, George W. Bush, estiver encarregado em Washington. Eles estão convencidos de que o país não pode realmente depender de qualquer candidato que venha a suceder Bush na presidência. Barack Obama, o virtual candidato democrata, já disse ser a favor de negociações diretas com Teerã. E mesmo se o republicano John McCain vencer a eleição, os políticos em Jerusalém não esperam que ele ordene um ataque como seu primeiro ato oficial -apesar de ter cantado, em uma aparição de campanha no ano passado, a canção "Barbara Ann" dos Beach Boys com a letra: "Bomb bomb bomb, bomb bomb Iran" (bombardeie o Irã).

Mas o presidente Bush enviou recentemente sinais que lembram de forma suspeita os preparativos para a guerra no Iraque. Naquele momento, como agora, ele insistiu que "todas as opções estão na mesa". E naquele momento, como agora, ele buscou aplacar os europeus ao dizer que todos os canais diplomáticos seriam esgotados primeiro. Mas durante sua recente visita à Eslovênia, Bush disse: "Há muitas urgências quando se trata de lidar com o Irã, e os políticos israelenses -se vocês forem a Israel e escutarem atentamente, vocês escutarão a urgência na voz deles".

Uma bomba nuclear iraniana ofuscaria todas as outras ameaças que Israel enfrentou durante seus 60 anos de existência. Por mais caras que suas guerras tenham sido, e por mais horríveis que possam ser os atentados suicidas de radicais islâmicos, eles nunca representaram uma ameaça séria à existência do Estado judeu.

Mas um único ataque nuclear teria conseqüências devastadoras para este pequeno país, que tem aproximadamente metade do tamanho da Suíça. De fato, os estrategistas internacionais normalmente se referem a Israel como o "país de uma bomba".

Os líderes militares em Jerusalém alegam que Teerã poderia restringir qualquer campanha militar israelense - na Faixa de Gaza, por exemplo - com apenas a ameaça crível de um ataque militar. Apesar de sua força militar, eles dizem, o país ficaria praticamente indefeso. Ainda pior, isto provocaria um êxodo da elite instruída, o que poderia significar um desastre para o país, tanto econômica quanto culturalmente. "O Irã estaria em posição de destruir o sonho sionista sem a necessidade de apertar um botão", disse Ephraim Sneh, um general reformado e ministro do Gabinete por muitos anos.

Todos os especialistas concordam que a bomba iraniana ainda não existe. Todavia, o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, continua ameaçando o Estado judeu de destruição a cada oportunidade. "Se os inimigos acham que podem quebrar a nação iraniana com pressão, eles estão errados", ele disse na semana passada.

Até mesmo o chefe da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Mohamed ElBaradei, manifestou em uma recente entrevista à "Spiegel" que o Irã está enviando a mensagem de que poderia "fabricar a bomba em um período relativamente breve".

E ninguém sabe melhor do que a liderança israelense quanto poder existe na mera crença de que um país possui armas nucleares. Afinal, o próprio Israel usou esta crença como um dissuasor nos últimos 40 anos. Acredita-se que cerca de 100 a 200 ogivas nucleares foram produzidas no reator de Dimona, no Deserto de Negev. O historiador israelense Benny Morris, que normalmente não é considerado um linha-dura, sugeriu recentemente o uso de armas: "Se a questão é se Israel ou o Irã deve perecer, então o Irã deve perecer".

Jerusalém já manifestou que não está apenas preparado, mas também é tecnicamente capaz de frustrar as ambições nucleares de um país hostil. Em 1981, os israelenses bombardearam o reator de Osirak, do Iraque. Voando em formação cerrada para evitar detecção pelo radar inimigo, oito caças-bombardeiros F-16 viajaram 900 quilômetros de Israel até o Iraque, onde lançaram 16 bombas de mil quilos, destruindo o reator. Victor Ostrovsky, um ex-agente do Mossad, revelou que os israelenses pagaram a um técnico francês que trabalhava no reator para plantar um transponder lá.

A segunda vez foi em 6 de setembro de 2007, quando caças-bombardeiros F-16 israelenses entraram no norte do espaço aéreo sírio, ao longo da fronteira turca e destruíram um sítio nuclear suspeito no leste da Síria. Antes do ataque, um grupo de soldados das forças especiais foi deixado no local para marcar o alvo com raio laser. Até hoje, o governo em Damasco alega que o local não era uma instalação nuclear. Mas imagens obtidas pelo Mossad do interior do prédio supostamente revelam semelhanças com o reator norte-coreano em Yongbyon.

O Irã poderá ser o próximo. Em uma recente carta ao chanceler austríaco Alfred Gusenbauer, o ministro da Defesa de Israel, Ehud Barak, escreveu que Teerã não está longe do "ponto sem retorno" no qual os israelenses acreditam que não mais conseguiriam impedir o desenvolvimento de uma bomba. Autoridades de inteligência israelenses acreditam que os engenheiros de armas iranianos poderiam ter urânio enriquecido suficiente para fabricar uma ogiva nuclear em 2009.

Ao chegar a esta conclusão, os israelenses estão contradizendo a afirmação, apresentada por um relatório da inteligência americana emitido em dezembro passado, de que o Irã encerrou seu programa de armas nucleares em 2003. "Os iranianos retomaram o programa em velocidade máxima em 2005", disse Yossi Kuperwasser, diretor de análise de inteligência da inteligência militar israelense na época.

'Nós veremos o Oriente Médio em chamas'

Apesar dos europeus continuarem a depositar suas esperanças na diplomacia e estarem convencidos de que uma solução negociada que permitiria a Teerã manter as aparências ainda é possível, os israelenses já vêem o regime de sanções da ONU como um fracasso. Rússia e China, eles dizem, sabotaram o boicote desde o início, e até mesmo os europeus apóiam sem muito entusiasmo as sanções.

Segundo os israelenses, empresas da Áustria e da Suíça assinaram recentemente acordos de entrega de gás natural com Teerã, e até mesmo o governo alemão limitou apenas ligeiramente o comércio com o regime dos mulás. "Os iranianos nem mesmo sentem as sanções", disse Tzachi Hanegbi, presidente do Comitê de Relações Exteriores e Defesa do Knesset. Segundo Hanegbi, a comunidade internacional terá que se unir caso espere conseguir algo, "e logo".

A chanceler alemã Angela Merkel é reticente na questão. Durante uma visita ao rancho do presidente George W. Bush, em Crawford, Texas, em novembro passado, Merkel prometeu "rever os contatos econômicos entre as empresas alemãs e o Irã" e pressionar por restrições adicionais.

Mas restava pouco dessa determinação quando Bush se encontrou com Merkel na última quarta-feira, em Schloss Meseberg, a casa de hóspedes do governo alemão fora de Berlim. Seu único comentário sobre outra rodada de sanções da ONU foi de que ela não as descartaria. Como um correligionário democrata-cristão dela reconheceu pessimistamente, "Merkel não está mais buscando esta questão com grande entusiasmo".

Políticos em Berlim notaram com sinais de preocupação a próxima guerra fermentando no Oriente Médio. O ex-ministro das Relações Exteriores, Joschka Fischer, que viaja regularmente a Jerusalém e Washington para conversações políticas, alertou que Israel poderia ver a presidência de Bush como sua última chance de obter apoio americano a um ataque militar. "Politicamente falando, a janela de ação é agora, nos últimos meses do mandato de George W. Bush", escreveu Fischer recentemente. "O Oriente Médio caminha para outro grande confronto."

Outros compartilham este senso de desconforto. Karl-Theodor Freiherr zu Guttenberg, um especialista em política externa e membro da conservadora União Social Cristã (CSU), diz que ele tem o "sentimento incômodo de que a contemplação de uma opção militar contra o Irã está ganhando nova dinâmica em Israel". Ele deseja que Berlim use suas relações estreitas com Jerusalém para impedi-lo de lançar um ataque militar.

Esta ofensiva política não seria sem risco. "Ao emitir este alerta, nós estamos assumindo ainda mais responsabilidade por (garantir que) nossa abordagem preferida produza resultados", disse Ruprecht Polenz, o presidente do Comitê de Relações Exteriores do Bundestag alemão. Em outras palavras, se o Irã continuar perseguindo seu programa nuclear, o Ocidente terá que cerrar fileira com Jerusalém. "Sob nenhuma circunstância deve ser criada a impressão de que Israel será deixado sozinho com a possibilidade de uma bomba atômica iraniana", disse Polenz.

Os principais aliados de Israel, os Estados Unidos, ainda estão certos sobre qual seria a melhor estratégia a respeito do Irã. O governo Bush está dividido. O vice-presidente Dick Cheney "ainda deseja um ataque", disse Flynt Leverett, um ex-funcionário do Departamento de Estado americano e atualmente um especialista em Oriente Médio da New America Foundation. Mas ele acredita que a secretária de Estado prefere uma abordagem diferente: "Condi Rice está ganhando tempo para que o presidente encerre seu mandato".

Bruce Riedel, um especialista em Oriente Médio que passou muitos anos trabalhando para a CIA, disse que seria "muito difícil para este governo iniciar uma guerra com o Irã. Haveria uma grande revolta do público e do Congresso". Mas a situação é diferente do ponto de vista de Israel, disse Riedel. "Há algum risco de que Israel ache que tem tempo limitado para agir e que conte com luz verde dos políticos americanos".

Além disso, a Força Aérea Israelense é conhecida por suas "soluções inventivas para problemas militares", disse Riedel, que tem fortes contatos com Israel, se referindo à viabilidade desse ataque. "Os planejadores militares israelenses me dizem que a missão é realizável".

Este é o motivo para Riedel ver um ataque militar israelense, com consentimento do governo americano, como o cenário de ataque mais provável. Mas as conseqüências, segundo Riedel, não seriam diferentes das de um ataque americano. "Um ataque israelense seria visto como um ataque americano. O Irã retaliará tanto contra Israel quanto contra os Estados Unidos". As conseqüências seriam fatais. "Nós veremos um Oriente Médio em chamas".

Todavia, em Israel não se trata mais de uma questão de realizar um ataque ou não, mas sim de quando. É claro que o ataque seria exclusivamente aéreo. Jerusalém recebeu recentemente aprovação de Washington para a compra de bombardeiros stealth F-22. As centrífugas usadas para enriquecer urânio na instalação nuclear de Natanz aparentemente são o alvo principal. Segundo a informação israelense, as centrífugas são mantidas acima do solo e, portanto são mais fáceis de destruir. O reator em Bushehr é visto como outro alvo possível.

E as defesas aéreas iranianas? "Nós sabemos que as defesas aéreas do Irã não estão entre as melhores do mundo", disse o ex-chefe do Mossad, Yatom. "Elas podem ser superadas". Todavia, muitos israelenses ainda esperam que os americanos façam o trabalho por eles. "Ainda pode ser o caso", disse Yatom, "de que George W. Bush queira garantir um lugar nos livros de história com este último ato".

Tradução: George El Khouri Andolfato


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