Nova ofensiva no Alemão

Exército reforça a tropa presente no complexo e PM ocupa dois morros vizinhos
 

Ana Cláudia Costa, Rogério Daflon e Sérgio Ramalho - O Globo
 
Logo após o intenso confronto de anteontem entre militares do Exército e traficantes no Alemão, a PM destacou 120 homens para ocupar por tempo indeterminado os morros do Adeus e da Baiana, vizinhos ao complexo. Policiais também estão em 11 pontos ao redor das favelas. O comandante militar do Leste, general Adriano Pereira Júnior, disse ontem que as balas traçantes vistas durante o conflito foram disparados dessas duas comunidades. Apesar de muito próximos ao Alemão, esses dois morros estão fora da área de ocupação do Exército, que também reforçou a tropa na região. São mais cem militares, aumentando o efetivo para 1.800. Outros 200 já estão à disposição e devem ser integrados à Força de Pacificação nos próximos dias.

 
- Sabíamos que era possível acontecer, mas não esperávamos. Fomos pegos de surpresa.

 
Ontem (anteontem), os tiros mais pesados vieram dos morros da Adeus e da Baiana. Imediatamente, conversei com a Secretaria de Segurança. Em seguida, a PM ocupou essas duas comunidades (na terça-feira à noite) - disse o general, em entrevista no Comando Militar do Leste (CML), acrescentando que o traficante Paulo Rogério de Souza Paz, o Mica, foragido da Vila Cruzeiro, está por trás do ataque.

 
O secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, que também participou da entrevista, afirmou que traficantes de outras favelas chegaram ao Alemão, de carro, anteontem à noite. Segundo o secretário, eles entraram no complexo através da Vila Cruzeiro, pela via que liga essa comunidade ao Alemão e que, em novembro passado, foi usada como rota de fuga de dezenas de criminosas, durante a ocupação da região por forças de segurança. Perguntando se sabia quantos eram os criminosos e de onde tinham saído, Beltrame respondeu que sim, mas que não diria, para não atrapalhar as investigações.

 
- Nossa investigação entende que esses traficantes já saíram do Complexo do Alemão - disse ele.

 
Quatro militares foram afastados
 

Para o comandante da PM, Mário Sérgio Duarte, traficantes que permanecem na comunidade também podem ter participado da ação:

- Eu trabalho com a hipótese de que ainda há remanescentes do tráfico (no local). A maioria não tem passagem pela polícia.

 
Ontem também, o comandante do CML disse que o conflito do último domingo entre moradores e militares do Exército, num bar no Complexo do Alemão, ocorreu devido à ação de dois traficantes.

 
- Os dois se evadiram de uma área de tráfico, entraram no bar e provocaram toda a confusão.

 
Esse foi o motivo de todo o conflito filmado pela comunidade, e não a história de se pedir para abaixar o som. Ocorre que alguns militares não tiveram a percepção de que aquilo era uma armadilha e acabaram fazendo uma ação errada - disse o comandante.

 
O general admitiu que traficantes ainda vendem drogas em bocas de fumo "itinerantes".

 
- Vamos voltar a fazer revistas em pessoas que possam estar fazendo algo errado. Naquela semana, havia sido divulgado que o Exército permaneceria no local. As ações dos bandidos foram uma reação à permanência do Exército lá - disse ele.

 
O general Adriano Pereira Júnior acrescentou que quatro militares envolvidos na confusão de domingo foram afastados. Um inquérito foi aberto para apurar as responsabilidades.

O Alemão ficará ocupado pelo Exército até junho, quando o complexo ganhará Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Hoje 17 favelas, onde vivem 280 mil pessoas, já estão pacificadas. Para Beltrame, não se pode vender ilusões à população em relação à luta contra o tráfico de drogas:

 
- Eu tenho sido bastante enfático ao dizer que, após 30, 40 anos de abandono de algumas áreas e total domínio do tráfico, ninguém vai resolver isso a curto prazo. Nós abrimos uma janela para que os serviços públicos e a própria sociedade cumpram o seu papel nessas comunidades.

 
Nove meses após a chegada da Força de Pacificação ao Alemão, o clima de medo e tensão retornou ao maior complexo de favelas do Rio. A lei do silêncio voltou como um fantasma para a população que já vivia dias de paz. Na Rua Joaquim de Queiroz, um dos acessos à Favela da Grota, uma barreira com ralos de ferro arrancados do chão, para evitar a entrada de carros, era um sinal da volta do tráfico à comunidade. Quando carros blindados se posicionaram no principal acesso à Grota, criminosos soltaram fogos para alertar seus cúmplices.

 
Quatro veículos blindados do tipo Urutu foram usados para patrulhar as entradas dos morros.

 
Todos os veículos e moradores que entravam eram revistados. Cinco artefatos explosivos de fabricação artesanal foram encontrados na Rua Nova. As estações do teleférico se transformaram praticamente em bases do Exército: nesses pontos, militares de binóculos vigiam a movimentação no complexo.

 
Um morador do Alemão contou que alguns traficantes sequer saíram da comunidade e outros já estão no local há tempos. Segundo ele, o tráfico quer provocar uma reação dos militares, para forçar a saída do Exército:

 
- É claro que o tráfico quer voltar. Ontem (anteontem), minha sensação foi de frustração. Há morador de bem sendo ameaçado para ser conivente com o tráfico. Tenho medo de voltar aos tempos do terror.

 
Outro morador disse que traficantes estão montando barricadas em diversos pontos do complexo, para enfrentar os militares. Segundo ele, os criminosos estão por trás das manifestações contra o Exército.

 
- Os que não foram presos retornaram e estão ameaçando moradores. Eles estão deixando todos acuados e com medo - disse.

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